Toca a pedalar!
Opinião » 2015-08-04 » Maria Augusta Torcato"Quem me conhece sabe que eu gostaria muito de saber andar de bicicleta."
A expressão “toca a pedalar” pode apresentar um sentido denotativo, quando se refere à ação de dar aos pedais, pedalar, ou um sentido conotativo, quando quer dizer que é preciso agir, fazer, realizar algo, não ficar parado, passivo ou indiferente. Toca a pedalar!
Quem me conhece sabe que eu gostaria muito de saber andar de bicicleta. Mas não sei. Nunca consegui equilibrar-me na bicicleta e, por isso, nunca aprendi. Aliás, qualquer atividade motora orientada, certinha, equilibrada, com ritmo e cadência é para mim, com certeza, pior que a viagem de Vasco da Gama à Índia. E isto porquê? O marinheiro português realizou o seu propósito, não obstante as dificuldades, mas eu, por muito esforço que despenda, não melhoro e não consigo levar até ao fim as atividades físicas que tão bem me fariam. Instaura-se a maior das confusões onde quer que eu esteja a praticar qualquer exercício físico em grupo: a ordem é para ir para a direita e eu vou para a esquerda, a ordem é para ir para a esquerda e eu vou para a direita, a ordem é para ir para a frente e eu vou para trás e, pronto, choco logo com quem está atrás e cumpre tudo direitinho. Lembro-me quando frequentei umas sessões de hidroginástica. Uma piscina enorme, um grupo simpático com uma monitora espetacular. Qual quê! Ainda era mais evidente: todas as colegas iam para o lado direito e só eu, como seguindo os versos de Régio, “não sei para onde vou”, “não sei por vou”, “sei que não vou por aí”, ia para o lado oposto. Uma única alminha, sempre perdida, para ali na piscina (“Iô, não sabe nadar! Iô, não sabe nadar!”). É claro que, mais do que exercício físico, praticava eu e ajudava os outros a praticar a terapia do riso.
Todo este exercício memorialístico para quê? É que não me sai da cabeça a proposta apresentada num conteúdo programático eleitoral: pôr aí umas determinadas alminhas a pedalar, a andar de bicicleta nas deslocações para o trabalho! Eu acho que a culpa é dos meus colegas de Educação Física, que já fazem, muitas vezes, o percurso casa-escola e escola-casa de bicicleta. Concorreram para esta ideia. Só pode! Há anos que os conheço a pedalar!
Agora, imagino muitos profissionais, como eu, que não sabem andar de bicicleta. É, talvez, a oportunidade derradeira para aprender e há que esperar pela prática! Imagino muitos profissionais que têm muitos quilómetros entre a casa e o local de trabalho. Imagino muitos profissionais que têm filhos que é preciso deixar na creche, no jardim-escola, na escola ou na avó. Que tipo de bicicleta os abonará?
Há ideias tão disparatadas, tão disparatadas (e aqui só foi evocada uma), que chego a questionar-me acerca da lucidez quer de quem tem a ideia quer de quem recebe a ideia.
E, reparando melhor, também já me questiono, tendo em conta o teor das propostas eleitorais, se quem se candidata quererá mesmo vencer. É que as ideias apresentadas seguem, à risca, o paradigma da idiotice.
Não me sai da cabeça o poema “Nevoeiro”, de Pessoa, o último de “Mensagem” e que começa assim:
Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer
Toca a pedalar!
Opinião » 2015-08-04 » Maria Augusta TorcatoQuem me conhece sabe que eu gostaria muito de saber andar de bicicleta.
A expressão “toca a pedalar” pode apresentar um sentido denotativo, quando se refere à ação de dar aos pedais, pedalar, ou um sentido conotativo, quando quer dizer que é preciso agir, fazer, realizar algo, não ficar parado, passivo ou indiferente. Toca a pedalar!
Quem me conhece sabe que eu gostaria muito de saber andar de bicicleta. Mas não sei. Nunca consegui equilibrar-me na bicicleta e, por isso, nunca aprendi. Aliás, qualquer atividade motora orientada, certinha, equilibrada, com ritmo e cadência é para mim, com certeza, pior que a viagem de Vasco da Gama à Índia. E isto porquê? O marinheiro português realizou o seu propósito, não obstante as dificuldades, mas eu, por muito esforço que despenda, não melhoro e não consigo levar até ao fim as atividades físicas que tão bem me fariam. Instaura-se a maior das confusões onde quer que eu esteja a praticar qualquer exercício físico em grupo: a ordem é para ir para a direita e eu vou para a esquerda, a ordem é para ir para a esquerda e eu vou para a direita, a ordem é para ir para a frente e eu vou para trás e, pronto, choco logo com quem está atrás e cumpre tudo direitinho. Lembro-me quando frequentei umas sessões de hidroginástica. Uma piscina enorme, um grupo simpático com uma monitora espetacular. Qual quê! Ainda era mais evidente: todas as colegas iam para o lado direito e só eu, como seguindo os versos de Régio, “não sei para onde vou”, “não sei por vou”, “sei que não vou por aí”, ia para o lado oposto. Uma única alminha, sempre perdida, para ali na piscina (“Iô, não sabe nadar! Iô, não sabe nadar!”). É claro que, mais do que exercício físico, praticava eu e ajudava os outros a praticar a terapia do riso.
Todo este exercício memorialístico para quê? É que não me sai da cabeça a proposta apresentada num conteúdo programático eleitoral: pôr aí umas determinadas alminhas a pedalar, a andar de bicicleta nas deslocações para o trabalho! Eu acho que a culpa é dos meus colegas de Educação Física, que já fazem, muitas vezes, o percurso casa-escola e escola-casa de bicicleta. Concorreram para esta ideia. Só pode! Há anos que os conheço a pedalar!
Agora, imagino muitos profissionais, como eu, que não sabem andar de bicicleta. É, talvez, a oportunidade derradeira para aprender e há que esperar pela prática! Imagino muitos profissionais que têm muitos quilómetros entre a casa e o local de trabalho. Imagino muitos profissionais que têm filhos que é preciso deixar na creche, no jardim-escola, na escola ou na avó. Que tipo de bicicleta os abonará?
Há ideias tão disparatadas, tão disparatadas (e aqui só foi evocada uma), que chego a questionar-me acerca da lucidez quer de quem tem a ideia quer de quem recebe a ideia.
E, reparando melhor, também já me questiono, tendo em conta o teor das propostas eleitorais, se quem se candidata quererá mesmo vencer. É que as ideias apresentadas seguem, à risca, o paradigma da idiotice.
Não me sai da cabeça o poema “Nevoeiro”, de Pessoa, o último de “Mensagem” e que começa assim:
Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer
Eleições "livres"... » 2024-03-18 » Hélder Dias |
Este é o meu único mundo! - antónio mário santos » 2024-03-08 » António Mário Santos Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza. |
Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato » 2024-03-08 » Maria Augusta Torcato Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente. |
A crise das democracias liberais - jorge carreira maia » 2024-03-08 » Jorge Carreira Maia A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David. |
A carne e os ossos - pedro borges ferreira » 2024-03-08 » Pedro Ferreira Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA. |
O Flautista de Hamelin... » 2024-02-28 » Hélder Dias |
Este mundo e o outro - joão carlos lopes » 2024-02-22 Escreve Jorge Carreira Maia, nesta edição, ter a certeza de que este mundo já não é o seu e que o mundo a que chamou seu acabou. “Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás”, vai ele dizendo na suas palavras sempre lúcidas e brilhantes, concluindo que “vivemos já num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria”. |
2032: a redenção do Planeta - jorge cordeiro simões » 2024-02-22 » Jorge Cordeiro Simões
|
Avivar a memória - antónio gomes » 2024-02-22 » António Gomes Há dias atrás, no âmbito da pré-campanha eleitoral, visitei o lugar onde passei a maior parte da minha vida (47 anos), as oficinas da CP no Entroncamento. Não que tivesse saudades, mas o espaço, o cheiro e acima de tudo a oportunidade de rever alguns companheiros que ainda por lá se encontram, que ainda lá continuam a vender a sua força de trabalho, foi uma boa recompensa. |
Eleições, para que vos quero! - antónio mário santos » 2024-02-22 Quando me aborreço, mudo de canal. Vou seguindo os debates eleitorais televisivos, mas, saturado, opto por um filme no SYFY, onde a Humanidade tenta salvar com seus heróis americanizados da Marvel o planeta Terra, em vez de gramar as notas e as opiniões dos comentadores profissionais e partidocratas que se esfalfam na crítica ou no elogio do seu candidato de estimação. |
» 2024-02-28
» Hélder Dias
O Flautista de Hamelin... |
» 2024-03-08
» Maria Augusta Torcato
Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato |
» 2024-03-18
» Hélder Dias
Eleições "livres"... |
» 2024-03-08
» Jorge Carreira Maia
A crise das democracias liberais - jorge carreira maia |
» 2024-03-08
» Pedro Ferreira
A carne e os ossos - pedro borges ferreira |