São sobras, Senhor! São sobras! - ana lúcia cláudio
Na falta de acções presenciais, multiplicaram-se, nos últimos meses, as iniciativas on-line sobre os mais diversos assuntos. Num destes eventos em que participei, sensibilizou-me, particularmente, o testemunho de um ex-ministro social-democrata que, quando questionado sobre um eventual regresso à vida política mais activa, reconheceu que não pretende fazê-lo porque, e nas suas palavras, os quatro anos em que foi ministro mudaram-no, levando amigos e familiares mais próximos a dizerem-lhe que, nessa altura, ele não era “o mesmo Nuno”. E acrescentou, para fundamentar a sua afirmação: “Todos os seres humanos são feitos de bom e mau, de altruísmo e orgulho, de desprendimento e egoísmo. O cargo de ministro não puxa pelo desprendimento mas pelo convencimento e teimosia. A política, às vezes por necessidade, puxa-nos por essa arrogância e por um auto-convencimento que é preciso ter para avançar em situações adversas. E não puxa tanto pela humildade, pelo desprendimento, pela consciência e por pôr o outro em primeiro lugar.”
Estas palavras de um político de primeira linha vão ao encontro da célebre expressão: “O poder corrompe”, e ecoam em mim com mais força à medida que vamos conhecendo os contornos dos diversos casos de alegada vacinação indevida contra a Covid-19.
Sem vacina contra a chico-espertice, as desculpas multiplicam-se com as tentativas de incluir à força, numa qualquer lista duvidosa, um familiar ou um amigo. E, de repente, como que por magia, todas as instituições e lares deste país se encheram de voluntários que, oportunamente, se tornaram merecedores da vacina. São inúmeros os casos que têm vindo à praça pública de políticos, responsáveis municipais, ou directores de instituições que, sem integrarem grupos prioritários, beneficiaram desta espécie de ouro líquido: nos dias que correm, tornou-se o bem mais precioso.
E, claro, Torres Novas não foi excepção. Por estas bandas, recorreu-se, contudo, a uma variante, não do vírus, mas da justificação invocada pelos que foram oportunamente apanhados “com a seringa no braço”. São as famosas sobras. Com a desculpa de que, sobrando vacinas, as mesmas não podiam ser desperdiçadas, foram, por isso, “aproveitadas” em quem estava mais à mão, curiosamente, sempre num braço com “pedigree”. De tal modo que na ausência de consciência, responsabilidade e bom senso dos cidadãos, teve de vir de cima um novo “decreto” para passar, também, a regular as ditas sobras, atribuindo-as a quem de direito, segundo critérios (lógicos) de prioridade.
E tal como na célebre lenda sobre a mais santa das rainhas da nossa história, e que, curiosamente, dá o nome ao hospital da cidade, eis que florescem por todos os lados, não rosas mas sobras. Só que, se o pão do regaço da rainha se transformou em rosas, em nome de um gesto altruísta e num acto de desprendimento e amor ao próximo, aqui é precisamente o contrário, é o amor-próprio, é a arrogância, é o poder de decidir aliado ao típico chico-espertismo de tentar sacar mais que o vizinho, acreditando que tais actos ficarão sempre impunes.
São sobras, Senhor! São sobras! - ana lúcia cláudio
Na falta de acções presenciais, multiplicaram-se, nos últimos meses, as iniciativas on-line sobre os mais diversos assuntos. Num destes eventos em que participei, sensibilizou-me, particularmente, o testemunho de um ex-ministro social-democrata que, quando questionado sobre um eventual regresso à vida política mais activa, reconheceu que não pretende fazê-lo porque, e nas suas palavras, os quatro anos em que foi ministro mudaram-no, levando amigos e familiares mais próximos a dizerem-lhe que, nessa altura, ele não era “o mesmo Nuno”. E acrescentou, para fundamentar a sua afirmação: “Todos os seres humanos são feitos de bom e mau, de altruísmo e orgulho, de desprendimento e egoísmo. O cargo de ministro não puxa pelo desprendimento mas pelo convencimento e teimosia. A política, às vezes por necessidade, puxa-nos por essa arrogância e por um auto-convencimento que é preciso ter para avançar em situações adversas. E não puxa tanto pela humildade, pelo desprendimento, pela consciência e por pôr o outro em primeiro lugar.”
Estas palavras de um político de primeira linha vão ao encontro da célebre expressão: “O poder corrompe”, e ecoam em mim com mais força à medida que vamos conhecendo os contornos dos diversos casos de alegada vacinação indevida contra a Covid-19.
Sem vacina contra a chico-espertice, as desculpas multiplicam-se com as tentativas de incluir à força, numa qualquer lista duvidosa, um familiar ou um amigo. E, de repente, como que por magia, todas as instituições e lares deste país se encheram de voluntários que, oportunamente, se tornaram merecedores da vacina. São inúmeros os casos que têm vindo à praça pública de políticos, responsáveis municipais, ou directores de instituições que, sem integrarem grupos prioritários, beneficiaram desta espécie de ouro líquido: nos dias que correm, tornou-se o bem mais precioso.
E, claro, Torres Novas não foi excepção. Por estas bandas, recorreu-se, contudo, a uma variante, não do vírus, mas da justificação invocada pelos que foram oportunamente apanhados “com a seringa no braço”. São as famosas sobras. Com a desculpa de que, sobrando vacinas, as mesmas não podiam ser desperdiçadas, foram, por isso, “aproveitadas” em quem estava mais à mão, curiosamente, sempre num braço com “pedigree”. De tal modo que na ausência de consciência, responsabilidade e bom senso dos cidadãos, teve de vir de cima um novo “decreto” para passar, também, a regular as ditas sobras, atribuindo-as a quem de direito, segundo critérios (lógicos) de prioridade.
E tal como na célebre lenda sobre a mais santa das rainhas da nossa história, e que, curiosamente, dá o nome ao hospital da cidade, eis que florescem por todos os lados, não rosas mas sobras. Só que, se o pão do regaço da rainha se transformou em rosas, em nome de um gesto altruísta e num acto de desprendimento e amor ao próximo, aqui é precisamente o contrário, é o amor-próprio, é a arrogância, é o poder de decidir aliado ao típico chico-espertismo de tentar sacar mais que o vizinho, acreditando que tais actos ficarão sempre impunes.
![]() Dizia-se do último czar da Rússia, Nicolau II, que a sua opinião era a opinião da última pessoa com quem tinha falado. Cem anos depois, Nicolau II reencarnou em alguma daquela rapaziada que tomou conta dos principais partidos da nossa democracia. |
![]() Quando saí de Torres Novas para ir estudar em Lisboa já sabia que iria depois sair de Lisboa para vir trabalhar em Torres Novas. A primeira razão para voltar foi de natureza umbilical: eu ser de Torres Novas como outros são de Mangualde ou Famalicão. |
![]() Se se observar o comportamento dos portugueses perante a pandemia, talvez seja possível ter um vislumbre daquilo que somos e de como gostamos de ser governados. Obviamente que não nos comportamos todas da mesma forma e não gostamos todos de ser governados da mesma maneira. |
![]() O herói nacional, melhor jogador de futebol do mundo de sempre, segundo dizem, foi protagonista numa daquelas histórias que são matéria-prima para solidificar lendas. Nessa história, sublinhando as origens humildes, o estratosférico conquista mais um laço com o Zé comum. |
![]() Apesar da limitação de vacinas nesta fase, o país tem vindo a ser confrontado com variados episódios de vacinação fora do que está priorizado. Há sempre alguém que se julga acima das normas ou que faz as suas próprias normas e ultrapassa assim os que estão na fila, ou então por via de terceiros chegam primeiro à seringa. |
![]() 1. O PSD de Torres Novas é uma anedota. Ao mesmo tempo que digo isto, ouço já ao fundo vozes a erguerem-se contra esta forma crua e dura de arrancar com este texto. Imagino até as conclusões de quem tem facilidade de falar sem saber: é do Bloco, dizem uns, comunista desde sempre, atiram outros, indo ainda mais longe, lembrando que dirige aquele pasquim comunista, conforme aprenderam com o ex-presidente socialista. |
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![]() Passo de ballet, movimento em que a bailarina estica graciosamente a perna, tem diferentes níveis de dificuldade consoante a direcção da perna e a altura a que chega o pé, requer um grande equilíbrio e um elevado nível de concentração. |
![]() Ouço os sinais ao longe. Um pranto gritado bem alto, do alto dos sinos da igreja, por alguém que partiu. É já raro ouvir-se. Por norma, pelo menos na nossa cidade, ecoam apenas pelos que muito deram de si à causa religiosa. |
» 2021-02-05
» Carlos Paiva
Hill Street Blues - carlos paiva |
» 2021-02-20
» Inês Vidal
PSD: a morte há muito anunciada - inês vidal |
» 2021-02-22
» José Ricardo Costa
Na mouche - josé ricardo costa |
» 2021-02-18
» Hélder Dias
Vacina |
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» Jorge Carreira Maia
O estranho caso das vacinas - jorge carreira maia |