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Um arco-íris em tons de cinza, por Inês Vidal

Opinião  »  2020-04-05  »  Inês Vidal

"A Ana João tem razão. Não vai ficar tudo bem."

Por estes dias, pedi às minhas filhas que pintassem um arco-íris para pendurarmos na porta de casa. Algo que dissesse, em todas as línguas latinas, e a quem por ali passasse, “vai ficar tudo bem”. No fundo, acho que me queria sentir uma boa mãe, daquelas que passaram os últimos quinze dias em casa a fazer de ponte entre seus filhos, uma escola fechada e uma resma de aulas online que mais parecia trabalhos forçados. Obrigada a ir trabalhar, se calhar mais ainda do que em dias normais, acabei por ceder à pressão das imagens passadas pelas muitas mães perfeitas que expunham nas redes sociais os seus belos trabalhos manuais de isolamento.

O bom da história é que, para mães imperfeitas, há filhas perfeitas. E a Ana João, contrariadíssima a pintar arco-íris com a legenda “Andrá tutto bene”, disse-me do alto da sua lucidez: “Sabes que não vai ficar tudo bem, não sabes? Isto é só para eles se entreterem porque não têm nada que fazer”. Parei sem resposta para tanta certeza num corpo de apenas 10 anos, e antes de me sorrir orgulhosa da filha que ali cresce, percebi que de facto não sou, nem quero ser, a mãe perfeita das redes sociais.

A Ana João tem razão. Não vai ficar tudo bem. Pelo caminho, morrerão muitas pessoas e muitas mais ainda morrem de solidão, todos os dias, aos bocadinhos. Pelo caminho, muitos filhos chorarão a ausência dos pais que, para os proteger, não voltarão tão cedo a casa. Pelo caminho, ficarão hábitos obsessivos de luta contra um bicho que não se vê, mas que se tem feito sentir. Pelo caminho, surgirá um mundo novo, nunca mais igual ao que deixámos para trás, onde nos abraçávamos e beijávamos sem distância.
Não sei se temos real noção daquilo que estamos a pedir às pessoas. Se me pedissem para ficar quinze dias em casa sem sair, fazia-o. Sei o que digo por experiência própria. Quando a causa é maior, é fácil acatar tal pedido. Mas reconheço que estamos a pedir muito a grande parte das pessoas. Especialmente àquelas a quem efectivamente exigimos que fechem a porta e vejam o mundo através de uma pequena janela embaciada.

A verdade é que já antes deste qualquer vírus que nos veio revolucionar a vida, a faixa etária mais idosa morria de solidão. O que hão-de dizer agora, quando lhe pedimos para não sair, para não verem os filhos ou netos, para não trocarem palavras com vizinhos, para não virem ao mercado à terça-feira, para não se confessarem na missa ou ao balcão da sua farmácia. Uma espécie de assalto disfarçado, assinado por quem nos lidera, onde a hipótese dada é apenas uma: “A morte ou a morte”.

Há muitos lados negros nesta história. Aliás, poucos são os que se pintam das cores do arco-íris. Por mais bandeiras que coloquemos à janela e palmas que entoemos nas varandas, por mais idílico o cenário das muitas horas que as famílias vão ter, finalmente, para se gozar uns aos outros, não vamos ficar todos bem. Muitos vão morrer. Muitos vão descobrir que não era aquela pessoa que queriam por perto, muitos vão sentir saudades do tempo que não passavam em casa, muitos vão descobrir que não notam qualquer diferença porque sozinhos já estavam, mas mais ainda vão sofrer na pele os efeitos da solidão que foram construindo.

Não li frase melhor que esta sobre estes dias que atravessamos: “Não romanciemos a pandemia”. Não há arco-íris que lhe dê cor, não há sonho que se torne realidade. Não há nada de bom que possa sair de uma situação em que dizemos às pessoas qual a vida que podem ou não podem viver!

 

 

 

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