A unidade de cardiologia do CHMT, instalada no hospital de Torres Novas até há uns anos, quando foi transferida sem qualquer justificação para o hospital de Abrantes, está em risco de ficar bastante debilitada, já que os últimos desenvolvimentos levaram à desarticulação de grande parte da sua capacidade.

Por despacho de 6 de Outubro, o presidente do conselho de administração, Casimiro Ramos, demitiu de funções o director do serviço de cardiologia por este, alegadamente, não ter tido capacidade para contratar médicos para o serviço e garantir as escalas da urgência. A decisão foi tomada após uma reunião anterior, destinada exactamente a analisar a situação do serviço e a dificuldade que estava a sentir-se para garantir escalas no serviço de urgência. Tomaram parte na reunião o próprio presidente do conselho de administração, o vogal executivo Carlos Gil, a directora clínica Ivone Caçador, Tiago Pereira e o director do serviço, David Durão.

Confrontado com a situação, o director do serviço de cardiologia confirmou que estava a sentir grandes dificuldades em garantir a contratação de médicos prestadores para garantir as escalas da urgência e o apoio desta à unidade cardiologia. Perante este quadro, Casimiro Ramos propôs a demissão de David Durão, e em reunião do conselho de administração de 6 de Outubro, foi deliberado, com um voto contra e uma abstenção, aprovar a proposta de demissão do director do serviço de cardiologia, formulada por Casimiro Ramos. Na sequ~encia da destituição de David Durão, mais outros dois médicos pediram as rescisão dos contratos com o CHMT.

Acontece que toda esta situação, nomeadamente a demissão de David Durão pelo CA é altamente questionável: não cabe, legalmente, a um director de serviço a avocação de recursos, nomeadamente a contratação de médicos, cuja competência é da administração. Por isso, os pressupostos que estiveram na base da proposta de demissão de David Durão são altamente discutíveis quanto à sua legalidade. 

Face a este quadro, o serviço de Cardiologia está fortemente fragilizado: para já, a urgência está tecnicamente parada ou com dificuldades em garantir as escalas de forma cabal, grande parte da consulta está limitada neste momento, tal como algumas actividades clínicas como o seguimento dos doentes com pacemaker. Ficaram no serviço apenas o dr. Valério, a dra. Helena e o dr. Linder, alguns à beira da idade de reforma. Os doentes urgentes deverão ser enviados para Lisboa ou Coimbra, mas segundo o JT apurou, o CODU ainda não tem instruções para alterar a ordem de envio dos doentes urgentes de cardiologia, continuando os mesmos a ser enviados para o hospital de Abrantes.

Segundo o JT também apurou, as dificuldades de garantir escalas na urgência médico-cirúrgica de Abrantes (a única existente nos três hospitais) também estão a preocupar a gestão do CHMT, particularmente tendo em atenção o período do Natal. O pior que poderia acontecer seria a urgência de Abrantes passar urgência básica, como as de Tomar e Torres Novas, onde não se pratica qualquer acto médico e nem um antibiótico é administrado, recuando-se mais de 70 anos na qualidade dos serviços de saúde na região.

Em comunicado distribuído à agência Lusa, o conselho de administração do CHMT refere que a decisão de destituição “é sustentada pela incapacidade de o diretor de serviço demitido adoptar medidas para garantir um nível satisfatório nas escalas de Cardiologia de apoio à Urgência Médico-Cirúrgica de Abrantes”. Nessa nota, a administração indica que David Durão “evidenciou um total desalinhamento com os objetivos da instituição, designadamente a necessidade de atender às especificidades regionais” de um centro hospitalar com as características do CHMT. “Não obstante as condições de atractividade que foram criadas por este conselho de administração, nomeadamente ao nível de avultados investimentos em equipamentos e meios de diagnóstico, o Dr. David Durão também não conseguiu tomar medidas para evitar a saída de profissionais para outras instituições”, diz a versão do conselho de administração no comunicado.

O presidente da Câmara de Torres Novas e outros autarcas estão ao corrente da situação, mas anda não vieram a terreiro, desta vez, informar os seus munícipes. Aliás, toda esta situação decorre de uma espécie de conluio inter-autárquico, que na sombra discute a distribuição de valências pelos três hospitais, muitas vezes ao arrepio de critérios clínicos e técnicos. O serviço de cardiologia funcionou muito bem até 2016, em Torres Novas, onde parece ser mais fácil atrair médicos do que para Abrantes, dada a maior proximidade de Torres Novas a Santarém, Lisboa ou Coimbra.