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In memoriam Francisco Canais Rocha (1930-2014)

Sociedade  »  2014-08-22 

Francisco Canais Rocha, combatente anti-fascista, ex-preso político, antigo dirigente do PCP (faceta que permanece tabu para o partido), primeiro coordenador da Intersindical e historiador, morreu no passado dia 10 de Agosto. Contava 84 anos e residia em Torres Novas, onde nasceu em 1930.

Desde muito novo, Francisco Canais Rocha envolveu-se no movimento associativo torrejano (foi fundador do núcleo campista ”Raiar da Aurora”) e nos movimentos locais de oposição ao regime salazarista. Após a escolaridade primária começou a trabalhar como marceneiro na oficina de Alberto Sepodes, pequeno industrial de pergaminhos republicanos, irmão de Manuel Sepodes, figura lendária do republicanismo local e primeiro militante do PCP em Torres Novas, logo após a fundação do partido, ainda na década de 20. Foi o primeiro contacto do ainda muito jovem Francisco com homens conotados com a oposição ao Estado Novo, estava a começar a década de 40. De marceneiro, Francisco Canais Rocha fez-se depois carpinteiro de moldes na oficina de Lourenço & Irmão até se empregar na metalúrgica Costa Nery, que seria um autêntico alfobre de militância sindical de resistência operária ao regime de Salazar.

A agitação foi, desde muito cedo, uma forma de luta encetada pelo jovem Francisco Canais Rocha e, de início, ele envolvi-a em acções de natureza cultural, quer animando tertúlias de café onde demonstrava, apesar da sua juventude, características e potencialidades intelectuais fora do comum, quer em actividades mais organizadas. Na pequena loja de João Espanhol, então colada à praça do peixe, promovia reuniões de jovens a quem induzia a leitura e depois a discussão de livros de Agostinho da Silva e outros autores desalinhados, para alem de, ele próprio, promover aulas de inglês e outras disciplinas aos seus companheiros, conhecimentos que adquirira por ele, no mais puro autodidactismo. Dizem os velhos amigos que o jovem Francisco resolvia contendas ”com a sabedoria de um juiz” e interpretava problemas ”como se fosse um filósofo”, indo ao ponto de suscitar invejas.

A sua actividade sindical, entretanto, levou-o à primeira prisão, em 1952, mas o cárcere não o desmobilizou: funda as estruturas sindicais dos trabalhadores metalúrgicos, concelhias e distritais, integra direcções locais e regionais do PCP (esta parte da notícia genérica, difundida pela LUSA e por todos os jornais é escondida pela notícia do ”Avante!”) e adere às comissões de apoio às candidaturas de Arlindo Vicente e Humberto Delgado, em 1958. Em 1961, já na clandestinidade, integrou a delegação dos trabalhadores portugueses ao V Congresso da Federação Sindical Mundial, realizado em Moscovo.

 

A militância no PCP

Em 1960 Francisco Canais Rocha, já funcionário clandestino do PCP, é destacado para levar a cabo a reorganização das estruturas partidárias no Porto, e com ele leva a que seria a companheira de uma vida, Rosalina Pólvora Garcia Labaredas, natural do Couço, pertencente, ela, ao comité local do PCP dessa aldeia do Ribatejo, onde estava envolvida na liderança da luta das mulheres camponesas sob o pseudónimo de ”Joaquim”.

O trabalho político de Canais Rocha no Porto é reconhecido pela cúpula partidária: em 1967 ele é já o responsável político pela Direcção da Organização Regional do Porto (DORP) do PCP e integra o comité central do partido como suplente. Mas, em 1968, era de novo preso pela PIDE numa casa ”ilegal” em Loures: no mesmo dia é igualmente presa a companheira, Rosalina Labaredas, e outros dois militantes, José Lobato Pulquério e a sua mulher Úrsula Machado Pulquério. Francisco Canais Rocha, defendido pelo jovem advogado José Augusto Rocha, seria condenado em 1969 pelo Tribunal Plenário de Lisboa a cinco anos de prisão efectiva e a sua mulher, Rosalina, igualmente condenada, em 22 de Setembro do mesmo ano, a dois anos de prisão correccional, tendo sido solta em 14 de Maio de 1970.

Liberto da cadeia de Peniche em 1973, Canais Rocha emprega-se no Sindicato dos Jornalistas e no Sindicato dos Electricistas e integra o grupo fundador da Intersindical (futura CGTP-IN).

 

Liberdade e expulsão do PCP

Não tinha passado uma semana sobre o 25 de Abril e Canais Rocha era eleito primeiro coordenador-geral da Intersindical, que daria lugar à CGTP. Tinha passado, entretanto, largos anos como dirigente de cúpula do PCP, e a assunção do cargo era o reconhecimento da sua posição de destaque na rede político-sindical.

Em Maio desse ano de 1974 ainda é eleito delegado dos trabalhadores portugueses à 59ª Conferência Internacional do Trabalho (OTI), realizada em Genebra e, aquando da formação do primeiro governo provisório saído do golpe militar do 25 de Abril, Francisco Canais Rocha, tido a certa altura como próximo de Álvaro Cunhal, esteve indicado para ocupar a pasta do Trabalho, mas um incidente que continua tabu para o PCP, que o omite da sua história oficial como já tinha acontecido nos casos de Francisco Paula de Oliveira ”Pavel” ou de Júlio Fogaça, entre outros, haveria de mudar o destino de Francisco Canais Rocha.

Na agitação que se seguiu ao golpe militar, militantes do MRPP (um grupo ”esquerdista” já então infiltrado por jovens ”pequeno-burgueses”, como Durão Barroso, e cuja missão estratégica do momento era desacreditar o ”social-fascismo” do PCP, tendo mantido reuniões secretas com Sá Carneiro e Mário Soares), terão tido acesso aos ficheiros da PIDE e constatado que Canais Rocha, sob os efeitos da tortura, não terá resistido, aquando da segunda prisão, a fornecer à polícia informações sobre outros militantes comunistas e a organização partidária. O PCP não desmentiu as acusações ao seu militante e perante o alarido provocado pelo grupelho ”contra-revolucionário”, como os comunistas designavam o MRPP, expulsou Francisco Canais Rocha e remeteu-o para uma posição ”recuada”. Em Agosto, Canais Rocha deixava também a coordenação da actual CGTP, que omite na sua história oficial as razões da saída do seu primeiro líder.

Expulso do PCP, Francisco Canais Rocha mantém-se como funcionário do Sindicato dos Electricistas e nos anos 80, já com mais de 50 anos, enveredou também pela vida académica, acabando por licenciar-se em História e atingir ainda o grau de mestre em História Contemporânea. Dedicou-se, depois, à investigação nas áreas da história do sindicalismo e do movimento operário. Publicou dezenas de artigos sobre a história do movimento operário e sindical e uma monografia sobre a história do movimento operário em Torres Novas, editada pelo município.


De regresso a Torres Novas

Com a reforma regressou a Torres Novas e, em 1996, funda a ARPE, de que foi presidente. Em 1998, funda a Federação dos Reformados do Ribatejo, a que presidiu e, em 2002, a União das Colectividades e Associações de Torres Novas, de que também foi presidente. Em 2003, o município de Torres Novas atribuiu-lhe Medalha de Mérito Cultural.

A comunidade torrejana em geral, e independentemente de orientações partidárias e outras, reconhecia a Francisco Canais Rocha a sua importância como combatente da liberdade e, mais uma vez, admirava-lhe, apesar da idade, a sua enorme capacidade de trabalho e a sua generosidade na luta em prol dos outros.

Tempo de pacificação, foi igualmente para Canais Rocha o reencontro gratificante com muitos e muitos companheiros de infância e de juventude das décadas de 40 e 50 em Torres Novas. Afastado de actividades políticas, Francisco Canais Rocha nunca emitiu qualquer opinião menos cordial para o PCP, que o expulsou, e cuja expulsão ele próprio explicou, um dia, a um investigador. Pelo contrário, chegou a apoiar as listas da CDU há alguns anos, já em Torres Novas

 

Um lamentável tabu

Por seu lado, na morte do seu ex-militante e antigo membro do comité central, o PCP não logrou, como habitualmente faz, emitir qualquer nota de imprensa manifestando o pesar pelo desaparecimento de tão destacada personalidade. A notícia publicada no ”Avante!” de 14 de Agosto omitia completamente quaisquer factos relacionados com a vida de dirigente do PCP de Canais Rocha, escondendo até a sua qualidade de ex-militante, como aliás a nota de imprensa da CGTP e quase todas as notícias publicadas nos jornais nacionais e regionais. Um manto de silêncio, aparentemente premeditado, abateu-se sobre a sua faceta de ex-dirigente do PCP, uma parte substancial e altamente valorosa da vida deste homem. Uma parte de que um incidente, que confirma toda a fragilidade humana, não o apouca e lhe acrescenta traços de humanidade em vez de o elevar a herói que não foi.

Francisco Canais Rocha foi uma figura incontornável da vida política e social torrejana do século XX e da primeira década deste século, um homem dotado de enorme tenacidade e de uma inquebrantável e obstinada fé no futuro e no papel, que os homens como ele, podem desempenhar na luta por uma humanidade mais justa e solidária.

Torres Novas, Agosto de 2014

João Carlos Lopes

 

 

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