O habitual
Opinião » 2015-08-07 » Jorge Carreira Maia"Demografia negativa, cultura social ineficaz e desadequação tecnológica, mais do que o défice público, são os problemas que precisam de ser compreendidos, pensados e enfrentados. Seria interessante ouvir o que os partidos políticos têm a dizer sobre eles..."
Entrámos em período de completo delírio. Faz parte da nossa tradição política em tempo pré-eleitoral. O fogo de artifício e os jogos florais a que as várias partes se entregam tendem a escamotear a dura realidade em que se vive. Temos o problema do défice que, com o actual governo e apesar de uma política drástica de cortes salariais e de aumento de impostos, cresceu cerca de 35% em relação àquele que Sócrates deixou. Há mais vida para além do défice, dir-se-á. O problema é que essa vida não é muito risonha.
Em primeiro lugar, a questão da baixa natalidade, com a inversão da pirâmide demográfica, conduzir-nos-á a uma crise séria nos sistemas de pensões e de solidariedade intergeracional. À crise da natalidade há que juntar, nos últimos anos, o retorno em força da emigração, agora de uma emigração bem qualificada, na formação da qual o país investiu muito, e da qual não obterá um retorno sólido.
De um ponto de vista imaterial, existe um problema estrutural que diz respeito à inexistência de uma cultura de iniciativa e de gestão de riscos. Num mundo globalizado e de intensa concorrência, os portugueses possuem uma cultura onde a iniciativa e a responsabilidade são sempre dos outros. É um problema que não se resolve, obviamente, com a actual retórica, servida por inúmeros cursos, sobre o empreendedorismo. A ausência de capacidade empreendedora (para usar a horrível palavra em voga) é apenas um caso particular do problema geral de ausência de iniciativa, de um povo que foi e é – não nos esqueçamos – sistematicamente educado para obedecer e fazer poucas ondas. Ora não há coisa que faça mais ondas do que ter iniciativa.
Por fim, o drama de um desemprego estrutural que não deriva só da intervenção da troika, mas que se deve ao atraso do país em relação a uma economia que tem no seu núcleo central, mesmo em actividades tradicionais, a digitalização. Muitos dos dramas que se abatem sobre muitas centenas de milhares de pessoas devem-se a uma desadequação das empresas, dos empresários e dos trabalhadores às novas formas de racionalização trazidas pela revolução das tecnologias da informação e da comunicação.
Demografia negativa, cultura social ineficaz e desadequação tecnológica, mais do que o défice público, são os problemas que precisam de ser compreendidos, pensados e enfrentados. Seria interessante ouvir o que os partidos políticos têm a dizer sobre eles, tendo em conta as circunstâncias em que nos encontramos e os limites a que nos submetemos. Todos sabemos, porém, que em vez disso vamos ter direito a fogo de artifício e a jogos florais. O habitual.
O habitual
Opinião » 2015-08-07 » Jorge Carreira MaiaDemografia negativa, cultura social ineficaz e desadequação tecnológica, mais do que o défice público, são os problemas que precisam de ser compreendidos, pensados e enfrentados. Seria interessante ouvir o que os partidos políticos têm a dizer sobre eles...
Entrámos em período de completo delírio. Faz parte da nossa tradição política em tempo pré-eleitoral. O fogo de artifício e os jogos florais a que as várias partes se entregam tendem a escamotear a dura realidade em que se vive. Temos o problema do défice que, com o actual governo e apesar de uma política drástica de cortes salariais e de aumento de impostos, cresceu cerca de 35% em relação àquele que Sócrates deixou. Há mais vida para além do défice, dir-se-á. O problema é que essa vida não é muito risonha.
Em primeiro lugar, a questão da baixa natalidade, com a inversão da pirâmide demográfica, conduzir-nos-á a uma crise séria nos sistemas de pensões e de solidariedade intergeracional. À crise da natalidade há que juntar, nos últimos anos, o retorno em força da emigração, agora de uma emigração bem qualificada, na formação da qual o país investiu muito, e da qual não obterá um retorno sólido.
De um ponto de vista imaterial, existe um problema estrutural que diz respeito à inexistência de uma cultura de iniciativa e de gestão de riscos. Num mundo globalizado e de intensa concorrência, os portugueses possuem uma cultura onde a iniciativa e a responsabilidade são sempre dos outros. É um problema que não se resolve, obviamente, com a actual retórica, servida por inúmeros cursos, sobre o empreendedorismo. A ausência de capacidade empreendedora (para usar a horrível palavra em voga) é apenas um caso particular do problema geral de ausência de iniciativa, de um povo que foi e é – não nos esqueçamos – sistematicamente educado para obedecer e fazer poucas ondas. Ora não há coisa que faça mais ondas do que ter iniciativa.
Por fim, o drama de um desemprego estrutural que não deriva só da intervenção da troika, mas que se deve ao atraso do país em relação a uma economia que tem no seu núcleo central, mesmo em actividades tradicionais, a digitalização. Muitos dos dramas que se abatem sobre muitas centenas de milhares de pessoas devem-se a uma desadequação das empresas, dos empresários e dos trabalhadores às novas formas de racionalização trazidas pela revolução das tecnologias da informação e da comunicação.
Demografia negativa, cultura social ineficaz e desadequação tecnológica, mais do que o défice público, são os problemas que precisam de ser compreendidos, pensados e enfrentados. Seria interessante ouvir o que os partidos políticos têm a dizer sobre eles, tendo em conta as circunstâncias em que nos encontramos e os limites a que nos submetemos. Todos sabemos, porém, que em vez disso vamos ter direito a fogo de artifício e a jogos florais. O habitual.
Insana Casa… » 2024-05-06 » Hélder Dias |
25 de Abril e 25 de Novembro - jorge carreira maia » 2024-05-05 » Jorge Carreira Maia Por que razão a França só comemora o 14 de Julho, o início da Revolução Francesa, e não o 27 ou 28 de Julho? O que aconteceu a 27 ou 28 de Julho de tão importante? A 27 de Julho de 1794, Maximilien Robespierre foi preso e a 28, sem julgamento, foi executado. |
O miúdo vai à frente » 2024-04-25 » Hélder Dias |
Família tradicional e luta do bem contra o mal - jorge carreira maia » 2024-04-24 » Jorge Carreira Maia A publicação do livro Identidade e Família – Entre a Consistência da Tradição e os Desafios da Modernidade, apresentado por Passos Coelho, gerou uma inusitada efervescência, o que foi uma vitória para os organizadores desta obra colectiva. |
Caminho de Abril - maria augusta torcato » 2024-04-22 » Maria Augusta Torcato Olho para o meu caminho e fico contente. Acho mesmo que fiz o caminho de Abril. O caminho que Abril representa. No entanto, a realidade atual e os desafios diários levam-me a desejar muito que este caminho não seja esquecido, não por querer que ele se repita, mas para não nos darmos conta, quase sem tempo de manteiga nos dentes, que estamos, outra vez, lá muito atrás e há que fazer de novo o caminho com tudo o que isso implica e que hoje seria incompreensível e inaceitável. |
As eleições e o triunfo do pensamento mágico - jorge carreira maia » 2024-04-10 » Jorge Carreira Maia Existe, em Portugal, uma franja pequena do eleitorado que quer, deliberadamente, destruir a democracia, não suporta os regimes liberais, sonha com o retorno ao autoritarismo. Ao votar Chega, fá-lo racionalmente. Contudo, a explosão do eleitorado do partido de André Ventura não se explica por esse tipo de eleitores. |
Eleições "livres"... » 2024-03-18 » Hélder Dias |
Este é o meu único mundo! - antónio mário santos » 2024-03-08 » António Mário Santos Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza. |
Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato » 2024-03-08 » Maria Augusta Torcato Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente. |
A crise das democracias liberais - jorge carreira maia » 2024-03-08 » Jorge Carreira Maia A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David. |
» 2024-04-25
» Hélder Dias
O miúdo vai à frente |
» 2024-04-22
» Maria Augusta Torcato
Caminho de Abril - maria augusta torcato |
» 2024-04-24
» Jorge Carreira Maia
Família tradicional e luta do bem contra o mal - jorge carreira maia |
» 2024-05-06
» Hélder Dias
Insana Casa… |
» 2024-05-05
» Jorge Carreira Maia
25 de Abril e 25 de Novembro - jorge carreira maia |