Foi lançada há cerca de um mês uma investigação de quatro episódios, que está disponível em vídeo no Youtube, levada a cabo pelo jornal “Al Jazeera”, sobre uma fuga de informação do Partido Trabalhista britânico. Cerca de 500 gigabytes de documentos, emails, videos e ficheiros áudio, que revelam de forma indubitável que membros do parlamento britânico, trabalhadores e militantes do partido forjaram provas falsas, usaram informações obtidas de forma ilícita, perseguiram e assediaram camaradas, fizeram falsas acusações e protegeram criminosos, numa tentativa de descredibilizar e até destruir a campanha eleitoral do então líder partidário Jeremy Corbyn (o único líder que se possa apelidar de “socialista” desde a década de 80) e de expulsar injustamente do partido muitos dos líderes locais que participaram na sua campanha.

Muito bom por ser objectivo e intenso por entrevistar as vítimas desta cabala, acaba por não explorar (e bem) as questões mais macroscópicas que imediatamente nos ocorrem ao ver a reportagem: que legitimidade tem o Partido Trabalhista em representar os seus eleitores? Será este um caso isolado no Reino Unido? Ou no mundo? Teremos nós também partidos em Portugal que funcionam na base da mentira, da ameaça e da coacção? Será este tipo de pessoas maquiavélicas que inevitavelmente tomam conta dos partidos e os tornam numa espécie de sistema feudal onde o líder eleito tem menos poder que aqueles que já foram nomeados? Será que isto acontece na minha comunidade, em Torres Novas?

Sei bem que a nossa realidade é dura e quase devota de propósito. Algo que motiva muitos de nós a continuar a contribuir para esta sociedade é a ideia de que “o povo é quem mais ordena” e que aqueles em quem votamos são aqueles que efectivamente nos representam e não alguém que é mentiroso, arbitrário ou facilmente corruptível (há grandes certezas no que toca a afirmar que a grande maioria das pessoas é quase sempre verdadeira, justa e íntegra). Mas a realidade está a tornar-se demasiado evidente. Os casos no nosso concelho já são gritantes e não houve sequer uma fuga de informação de 500 gigabytes, apenas o ocasional mexerico, não vá o denunciante sofrer represálias da máquina partidária que controla o nosso concelho há décadas.

 Desde que abracei a causa de libertar a nascente do nosso rio, falei com muita gente que dizia que “não valia a pena”, que “era uma causa perdida” e contavam-me, por vezes com detalhe e pormenor, as jogatanas, os interesses e a decadência moral daqueles a quem deram a maioria. Estamos a falar mais em concreto de favorecimentos nas contratações, nos ajustes directos, de usurpações de associações, de assédio no trabalho, de negligência da coisa pública e de mentiras de sorriso amarelo tentando encobrir tudo isto.

 É óbvio que isto não passa de insinuações que podem não ser completamente verdadeiras. Mas mesmo o que não é completamente verdadeiro, continua a ter uma grande parte de verdade. A saída da ex-directora Carla Paixão do jornal “O Almonda” foi acompanhado de uma publicação nas redes sociais em que, de forma bastante directa, dizia que um dos motivos que a levavam a demitir-se era não conseguir manter o compromisso com os três pilares que esta acha fundamentais no jornalismo, enumerando: a verdade, a justiça e a liberdade. Que o jornal “O Almonda” é propaganda da autarquia já muitos (provavelmente todos) dos leitores deste jornal sabem. Esta publicação reduziu apenas o número de pessoas que possivelmente contribuem para que assim seja.

 Outro recente caso concreto vem com a eleição do Francisco Dinis para presidente da concelhia do Partido Socialista de Torres Novas. Alguém que em jovem aldrabou eleições internas e que, no entanto, chega a deputado com toda uma legião de fãs atrás de si, provavelmente também da sua laia maquiavélica, sedenta de poder sem olhar a meios, tal e qual a oposição interna de Jeremy Corbyn.

“Os casos no nosso concelho já são gritantes e não houve sequer uma fuga de informação de 500 gigabytes, apenas o ocasional mexerico, não vá o denunciante sofrer represálias da máquina partidária que controla o nosso concelho há décadas.