Desindividualização
Opinião » 2009-02-05 » Eduarda Gameiro
O poder reside nos grupos, nas multidões, nas maiorias. Este pressuposto faz parte do senso comum e é tão óbvio que nem nos atrevemos a duvidar dele. Porém, ao absorver este sentimento de união para satisfazer a nossa necessidade de protecção, deixamos de existir como pessoas para passar a fazer parte do grupo… E deixamos de amar como pessoas para passar a odiar o que está fora do grupo. Vendemos a nossa humanidade, a nossa individualidade, em troca de protecção.
Homossexuais, muçulmanos, ciganos são discriminados por cá, tal como o são os nossos emigrantes em França e na África do Sul. Mas, no fundo, todos sabemos que o sangue de uma ou de outra minoria não está congenitamente contaminado com maldade. Ninguém nasce essencialmente mau; é errado e perigoso reduzir os sentimentos e os comportamentos à linearidade do código genético, e nós até aceitamos isso. Não é aí que nos custa encarar a Diferença. A Diferença ofende porque nos desagrega, porque ver e aprender com alguém diferente realça que somos pessoas especiais e únicas. A Diferença, enquanto hino à Pessoa, é um atentado à união do grupo e ao poder e, se não for discriminada e rotulada, se não a temermos, vai-se transformar em Mudança. Assim, temos medo que o mundo mude e que não consigamos mudar com ele, perdendo o domínio que exercemos confortavelmente, enquanto partes não-individualizaveis e não-existentes de alguma nação protectora. Para evitar esse flagelo, matamos.
E, entretanto, no decorrer da nossa batalha contra a evolução (contra a mesma evolução que nos dotou da capacidade de lutar para que nada mude…), vamos pegando fogo a esses pequenos grãos de areia enterrados nos alicerces da nossa casa tão solidamente erguida na praia, que nos lembram incomodamente que somos, no fundo, areia frágil, à mercê desses milhares de mares de consciências e culturas… Pegamos fogo àquilo que nos lembra que somos indivíduos… Que não somos A nação, mas fragmentos de nações… E o que arde, no fundo, é a nossa casa, a cicatriz que une, como uma bandeira, humanidades que se desvaneceram quando fizeram derramar a primeira gota de sangue impuro. Consumimos o que nos era sagrado pelo ódio às ameaças contra o que nos era sagrado.
Quando, como agora, nos faltam as forças, esquecemo-nos que somos indivíduos e que a nossa única nação é a Natureza e o Universo… Esquecemo-nos que podemos nascer de diferentes cores, em diferentes culturas, mas que caminhamos todos na mesma estrada… Esquecemo-nos que ardemos todos da mesma maneira…
Um indiano foi queimado vivo numa estação de metro em Itália. O ser humano assina a sangue a sua sentença de morte. Rega-se a si próprio com gasolina, acendendo as chamas do ódio na faísca do medo, e só demasiado tarde, só quando já não for capaz de existir fora do grupo, é que há-de reparar que afinal é a si próprio que se odeia…
Desindividualização
Opinião » 2009-02-05 » Eduarda GameiroO poder reside nos grupos, nas multidões, nas maiorias. Este pressuposto faz parte do senso comum e é tão óbvio que nem nos atrevemos a duvidar dele. Porém, ao absorver este sentimento de união para satisfazer a nossa necessidade de protecção, deixamos de existir como pessoas para passar a fazer parte do grupo… E deixamos de amar como pessoas para passar a odiar o que está fora do grupo. Vendemos a nossa humanidade, a nossa individualidade, em troca de protecção.
Homossexuais, muçulmanos, ciganos são discriminados por cá, tal como o são os nossos emigrantes em França e na África do Sul. Mas, no fundo, todos sabemos que o sangue de uma ou de outra minoria não está congenitamente contaminado com maldade. Ninguém nasce essencialmente mau; é errado e perigoso reduzir os sentimentos e os comportamentos à linearidade do código genético, e nós até aceitamos isso. Não é aí que nos custa encarar a Diferença. A Diferença ofende porque nos desagrega, porque ver e aprender com alguém diferente realça que somos pessoas especiais e únicas. A Diferença, enquanto hino à Pessoa, é um atentado à união do grupo e ao poder e, se não for discriminada e rotulada, se não a temermos, vai-se transformar em Mudança. Assim, temos medo que o mundo mude e que não consigamos mudar com ele, perdendo o domínio que exercemos confortavelmente, enquanto partes não-individualizaveis e não-existentes de alguma nação protectora. Para evitar esse flagelo, matamos.
E, entretanto, no decorrer da nossa batalha contra a evolução (contra a mesma evolução que nos dotou da capacidade de lutar para que nada mude…), vamos pegando fogo a esses pequenos grãos de areia enterrados nos alicerces da nossa casa tão solidamente erguida na praia, que nos lembram incomodamente que somos, no fundo, areia frágil, à mercê desses milhares de mares de consciências e culturas… Pegamos fogo àquilo que nos lembra que somos indivíduos… Que não somos A nação, mas fragmentos de nações… E o que arde, no fundo, é a nossa casa, a cicatriz que une, como uma bandeira, humanidades que se desvaneceram quando fizeram derramar a primeira gota de sangue impuro. Consumimos o que nos era sagrado pelo ódio às ameaças contra o que nos era sagrado.
Quando, como agora, nos faltam as forças, esquecemo-nos que somos indivíduos e que a nossa única nação é a Natureza e o Universo… Esquecemo-nos que podemos nascer de diferentes cores, em diferentes culturas, mas que caminhamos todos na mesma estrada… Esquecemo-nos que ardemos todos da mesma maneira…
Um indiano foi queimado vivo numa estação de metro em Itália. O ser humano assina a sangue a sua sentença de morte. Rega-se a si próprio com gasolina, acendendo as chamas do ódio na faísca do medo, e só demasiado tarde, só quando já não for capaz de existir fora do grupo, é que há-de reparar que afinal é a si próprio que se odeia…
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A carne e os ossos - pedro borges ferreira » 2024-03-08 » Pedro Ferreira Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA. |
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