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Apenas Humano

Opinião  »  2009-03-19  »  Eduarda Gameiro

Conta-se que, uma vez, nas margens de um lago, um escorpião pediu a um sapo que o atravessasse às costas para o outro lado. O sapo recusou, temendo que o escorpião se aproveitasse da posição de superioridade e o picasse. Porém, o escorpião afirmou: ”Tens medo de quê? Se eu te ferisse a meio da viagem, iríamos os dois ao fundo e eu morreria contigo…”. O sapo ficou convencido com o argumento do escorpião e aceitou transporta-lo até ao outro lado do lago. A um certo ponto da travessia, o escorpião, num romântico e pré-determinado movimento ao qual já estaria certamente habituado, picou o sapo. Este, antes de morrer, perguntou ao escorpião porque é que tinha cometido tal flagelo, que lhe iria custar a vida, ao que o último respondeu: ”Sou um escorpião… É a minha natureza…”

A vida existe para sobreviver, e esta fábula, se for vista a uma certa escala, não contradiz este princípio. Se o escorpião não sentisse, como um vício estimulado desde nascença, um desejo irreprimível de atacar o sapo que o carregava às costas, talvez não fosse um predador do seu mundo. Se cada escorpião não colocasse este instinto à frente da sua própria vida, poderia nem sequer ser viável a sua existência enquanto espécie. Este escorpião estava, apenas, condenado a repetir o mesmo movimento fatal que permite a sobrevivência de milhões de outros.

É tudo uma questão de escala. Para sobrevivermos, as células idosas e degeneradas do nosso corpo têm de morrer. Para a nossa vida fluir, temos de dissipar a vida de muitas das pequenas partes de nós que, embora existam individualmente, só fazem sentido como um todo. E talvez para a nossa espécie se preservar e evoluir seja necessário isolar e abater os degenerados, os doentes, os inférteis e os geneticamente inaptos. Talvez para alguém que veja o nosso mundo por algum microscópio fizesse afinal todo o sentido isolar os tuberculosos e os leprosos… Ilegalizar a reprodução dos mais doentes, dos mais fracos… dos mais feios…

Mas como é que se explica a uma pequena célula que a sua mãe e o seu pai têm de morrer para algo superior a todos eles sobreviver? Que sentido é que a morte pode possivelmente ter na cabeça de quem sofre? É inconcebível para nós enquanto pessoas aceitar a eliminação de um elemento da espécie com o simples propósito da sua preservação. É, até, ridícula a simples ideia de que podemos determinar quem é geneticamente inapto e quem possui os requisitos mínimos para poder viver em sociedade.

Existimos neste planeta, vivemos à escala humana. Toda a gente deseja que o Homem como a conhecemos ainda exista daqui a mil anos. Mas quem sente uma condenação à morte, quem ouve pedras de ódio quebrar as janelas da sua casa, quem sofre os tormentos da exclusão social não é a espécie: é o indivíduo, o homem, o animal, essa peça minúscula, parte de algo infinitamente maior, mas que faz todo o sentido isoladamente. O indivíduo tem o direito de existir só por existir, sem ser apenas uma roda dentada dentro destas gigantescas engrenagens que residem em escalas superiores à nossa. E que se lute por esse direito, que se negue o poder a esses que, do alto dos seus inacessíveis cadeirões de madeira, nos conseguem reduzir a peças de um jogo de xadrez.

Enfim, como a minha opinião não pode aspirar a representar a da humanidade, falo apenas por mim: Vivo condenado a esta natureza anti-natural que é apaixonar-me pelo indivíduo e desprezar a sobrevivência da espécie. E se me perguntarem porque é que apunhalo pelas costas este couraçado que me transporta ao longo de algum enorme lago, eu respond ”Sou humano… Apenas humano…”

 

 

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