• SOCIEDADE-  • CULTURA  • DESPORTO  • OPINIÃO
  Quinta, 02 Maio 2024    •      Directora: Inês Vidal; Director-adjunto: João Carlos Lopes    •      Estatuto Editorial    •      História do JT
   Pesquisar...
Dom.
 22° / 14°
Céu nublado com chuva fraca
Sáb.
 23° / 9°
Céu nublado com chuva fraca
Sex.
 21° / 7°
Céu nublado
Torres Novas
Hoje  18° / 7°
Períodos nublados com chuva fraca
       #Alcanena    #Entroncamento    #Golega    #Barquinha    #Constancia 

A tia

Opinião  »  2013-06-28  »  Graça Rodrigues

Não sei se hei-de ficar nesta casa mais um Inverno ou não. Não aguento outro Inverno cheia de frio, nem a humidade, este chão gelado, a porta que dá directamente para a rua, o vento que assobia da chaminé, as janelas mal calafetadas, o aquecedor desligado porque o dinheiro não chega, ficar isolada dentro da cama porque é onde está mais quente. Vai ser um suplício se eu aqui ficar, e nem sei se vou aguentar. Os meus pés estão sempre gelados, tão gelados como um bloco de gelo, e passo os dias com eles enfiados em mantas, com um saco de água quente por cima e outro por baixo. E toda a noite enrolada nas mantas e nos sacos de água quente, até a água ficar fria e eu ter que me levantar para a aquecer outra vez. Eu sempre fui assim friorenta dos pés. Só para tu veres que estou a falar verdade, olha que uma vez, eu ainda andava a servir, aconteceu uma história em casa do senhor engenheiro, por causa dos sacos de água quente, que ainda hoje me faz corar de vergonha: quando eu fui servir para Lisboa fui para casa deste casal, ela era professora e ele o senhor engenheiro, dono de uma fábrica, e tinham uma menina. Como eu vinha da província e tinha sempre receio de parecer parola, tive vergonha de ir comprar uma botija de água quente naquele primeiro inverno. Hoje reconheço que foi parvoíce minha, o que é que tem de saloio comprar botija de água quente? Mas, na altura, eu pensava assim. Então, à noite, antes de ir para a cama, eu aquecia um grande tacho de água, quase a ferver, e levava-o para o fundo da cama e encostava lá os pés. Um dia, os senhores saíram e disseram que não vinham almoçar. E, nessa noite, o tacho entornou-se todo pela cama e ensopou-me o colchão. Como os senhores não vinham tão cedo, resolvi pôr o colchão à janela da sala para secar, porque dava para uma varanda virada ao sol. Qual não é o meu espanto quando ouço a chave rodar na porta e os meus patrões entrarem:

-Ó mulher, o que é que faz o colchão à janela? Você descuidou-se, mulher?

-Não, senhor engenheiro! Grande mijadela seria essa! Foi uma tachada de água que eu tinha aos pés da cama…

E contei-lhes do tacho. Eles fartaram-se de rir à custa da minha parolice, e no outro dia trouxeram-me cinco botijas. Vê lá bem: cinco! Nessa casa nunca mais tive os pés frios!

Mas estou a desviar-me do assunto. Acho que vou aceitar que me ponhas nesse tal lar. Lá não deve fazer tanto frio e hei-de passar melhor o Inverno encostada aos aquecedores. Mas não sei o que faça…Por um lado havia de ir, por causa da minha saúde, e por outro acho que não posso ir sujeitar-me outra vez a receber ordens de ninguém. Sabes, são muitos anos habituada a viver sozinha, e a pensar com a minha cabeça casmurra. Só se eu for para lá e estabelecer muito bem as regras todas à partida. Deixar tudo escritinho no papel. Se prometerem não me chatear. Se eu tiver a chave e puder entrar e sair quando quiser, levar quem eu entender, e comer o que eu quiser, já estás a ver…ficar à minha vontade, não dar satisfações a mais ninguém. Só assim. Não estou para aturar ordens deles. Não aturei ordens de um marido, quanto mais de desconhecidos!
Vá, miúda, chega-me aqui essa manta aos pés, apaga a luz e vai-te embora. Não tenhas pena de mim, que não há-de ser esta noite que hei-de morrer de frio. O frio não mata, o que mata é esquecerem-nos. Já morri há muito tempo!

 

 

 Outras notícias - Opinião


O miúdo vai à frente »  2024-04-25  »  Hélder Dias

Família tradicional e luta do bem contra o mal - jorge carreira maia »  2024-04-24  »  Jorge Carreira Maia

A publicação do livro Identidade e Família – Entre a Consistência da Tradição e os Desafios da Modernidade, apresentado por Passos Coelho, gerou uma inusitada efervescência, o que foi uma vitória para os organizadores desta obra colectiva.
(ler mais...)


Caminho de Abril - maria augusta torcato »  2024-04-22  »  Maria Augusta Torcato

Olho para o meu caminho e fico contente. Acho mesmo que fiz o caminho de Abril. O caminho que Abril representa. No entanto, a realidade atual e os desafios diários levam-me a desejar muito que este caminho não seja esquecido, não por querer que ele se repita, mas para não nos darmos conta, quase sem tempo de manteiga nos dentes, que estamos, outra vez, lá muito atrás e há que fazer de novo o caminho com tudo o que isso implica e que hoje seria incompreensível e inaceitável.
(ler mais...)


As eleições e o triunfo do pensamento mágico - jorge carreira maia »  2024-04-10  »  Jorge Carreira Maia

Existe, em Portugal, uma franja pequena do eleitorado que quer, deliberadamente, destruir a democracia, não suporta os regimes liberais, sonha com o retorno ao autoritarismo. Ao votar Chega, fá-lo racionalmente. Contudo, a explosão do eleitorado do partido de André Ventura não se explica por esse tipo de eleitores.
(ler mais...)


Eleições "livres"... »  2024-03-18  »  Hélder Dias

Este é o meu único mundo! - antónio mário santos »  2024-03-08  »  António Mário Santos

Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza.
(ler mais...)


Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato »  2024-03-08  »  Maria Augusta Torcato

Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente.
(ler mais...)


A crise das democracias liberais - jorge carreira maia »  2024-03-08  »  Jorge Carreira Maia

A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David.
(ler mais...)


A carne e os ossos - pedro borges ferreira »  2024-03-08  »  Pedro Ferreira

Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA.
(ler mais...)


O Flautista de Hamelin... »  2024-02-28  »  Hélder Dias
 Mais lidas - Opinião (últimos 30 dias)
»  2024-04-22  »  Maria Augusta Torcato Caminho de Abril - maria augusta torcato
»  2024-04-25  »  Hélder Dias O miúdo vai à frente
»  2024-04-24  »  Jorge Carreira Maia Família tradicional e luta do bem contra o mal - jorge carreira maia
»  2024-04-10  »  Jorge Carreira Maia As eleições e o triunfo do pensamento mágico - jorge carreira maia