A justa distância - jorge carreira maia
"O importante, do ponto de vista moral, é descobrir a distância exacta que devemos manter relativamente aos outros"
Começamos a descobrir que eram exorbitantes as expectativas de que a pandemia fosse um pesadelo que passaria na manhã seguinte. Quando se confinou, a esperança era que tudo voltasse ao habitual passadas duas semanas, talvez quatro. A ideia radicava na inocência e na ignorância. Com o passar dos dias fomos percebendo que a vida iria mudar mais do que gostaríamos. A experiência das últimas semanas está a dar-nos uma percepção da realidade que não esperávamos.
A moral aristotélica coloca a virtude na justa medida. Esta significa o meio termo entre dois vícios. A virtude da coragem, por exemplo, seria equidistante do vício da cobardia e do da temeridade. A pandemia veio trazer outra perspectiva da justa medida. Qual a justa distância entre mim e os outros? Que espaço físico devo manter para protecção de todos? Esta distância espacial que nos está a ser imposta terá, por certo, efeitos na forma como nos relacionamos.
O importante, do ponto de vista moral, é descobrir a distância exacta que devemos manter relativamente aos outros para que não se aproximem demasiado e, ao mesmo tempo, para que não se afastem em excesso. Neste momento, o desrespeito dessa justa distância é já alvo de crítica, quando é propositado, ou de lamento, quando, como nos transportes públicos, parece ser uma inevitabilidade. A justa distância torna-se, deste modo, o objecto central da conduta moral.
Isto coloca um problema político. Não se trata apenas de gerir, através da autoridade e da coerção, a justa distância que os membros da comunidade devem manter entre si, mas de encontrar a justa distância que o político deve manter tanto em relação aos outros políticos como aos cidadãos. Alguns dos debates dos últimos tempos giraram já em torno da justa distância. As comemorações do 25 de Abril asseguravam a justa distância? E a coreografia da CGTP no 1.º de Maio? E a manifestação anti-racista de há dias ou a manifestação do Chega e o jantar que promoveu em Torres Novas? Quantos deputados podem estar ao mesmo tempo no parlamento?
A justa distância impõe uma nova relação, ainda desconhecida, com os eleitores, mas também entre os próprios políticos. À partida parece ser uma questão de cuidado sanitário, mas talvez não seja descabido lembrar que muitos problemas políticos nascem de questões espaciais, e que o espaço que cada um deverá preservar da invasão do outro vai, por questões de saúde, ser investido de forte carga salvífica, isto é, vai tornar-se um espaço sagrado, que só a justa distância respeitará. Não há coisa mais política do que um espaço sacralizado.
A justa distância - jorge carreira maia
O importante, do ponto de vista moral, é descobrir a distância exacta que devemos manter relativamente aos outros
Começamos a descobrir que eram exorbitantes as expectativas de que a pandemia fosse um pesadelo que passaria na manhã seguinte. Quando se confinou, a esperança era que tudo voltasse ao habitual passadas duas semanas, talvez quatro. A ideia radicava na inocência e na ignorância. Com o passar dos dias fomos percebendo que a vida iria mudar mais do que gostaríamos. A experiência das últimas semanas está a dar-nos uma percepção da realidade que não esperávamos.
A moral aristotélica coloca a virtude na justa medida. Esta significa o meio termo entre dois vícios. A virtude da coragem, por exemplo, seria equidistante do vício da cobardia e do da temeridade. A pandemia veio trazer outra perspectiva da justa medida. Qual a justa distância entre mim e os outros? Que espaço físico devo manter para protecção de todos? Esta distância espacial que nos está a ser imposta terá, por certo, efeitos na forma como nos relacionamos.
O importante, do ponto de vista moral, é descobrir a distância exacta que devemos manter relativamente aos outros para que não se aproximem demasiado e, ao mesmo tempo, para que não se afastem em excesso. Neste momento, o desrespeito dessa justa distância é já alvo de crítica, quando é propositado, ou de lamento, quando, como nos transportes públicos, parece ser uma inevitabilidade. A justa distância torna-se, deste modo, o objecto central da conduta moral.
Isto coloca um problema político. Não se trata apenas de gerir, através da autoridade e da coerção, a justa distância que os membros da comunidade devem manter entre si, mas de encontrar a justa distância que o político deve manter tanto em relação aos outros políticos como aos cidadãos. Alguns dos debates dos últimos tempos giraram já em torno da justa distância. As comemorações do 25 de Abril asseguravam a justa distância? E a coreografia da CGTP no 1.º de Maio? E a manifestação anti-racista de há dias ou a manifestação do Chega e o jantar que promoveu em Torres Novas? Quantos deputados podem estar ao mesmo tempo no parlamento?
A justa distância impõe uma nova relação, ainda desconhecida, com os eleitores, mas também entre os próprios políticos. À partida parece ser uma questão de cuidado sanitário, mas talvez não seja descabido lembrar que muitos problemas políticos nascem de questões espaciais, e que o espaço que cada um deverá preservar da invasão do outro vai, por questões de saúde, ser investido de forte carga salvífica, isto é, vai tornar-se um espaço sagrado, que só a justa distância respeitará. Não há coisa mais política do que um espaço sacralizado.
![]() Em meados da década de 60 do século passado, ainda o centro da então vila de Torres Novas pulsava ao ritmo das fábricas. Percorrendo-a, víamos também trabalhadores de pequenas oficinas e vários mesteres. |
![]() Votar é decidir, não votar é deixar a decisão que nos cabe nas mãos de outros. Uma verdade, tantas vezes repetida. No entanto, a abstenção tem mantido uma tendência ascendente nos vários actos eleitorais. |
![]() O funambulismo é uma arte circense que consiste em equilibrar-se, caminhando, saltando ou fazendo acrobacias sobre uma corda bamba ou um cabo metálico, esticados entre dois pontos de apoio. Ao funambulista cabe a difícil tarefa de chegar ao segundo ponto de apoio sem partir o pescoço. |
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É plausível afirmar que o corpo político, ao contrário do que aconteceu na primeira vaga da pandemia, não tem estado feliz na actual situação. Refiro-me ao Presidente da República, ao Primeiro-Ministro e aos dirigentes das várias oposições. |
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- Ó querida, sou tão bom. Mas tão bom que até vais trepar pelas paredes. - Ai sim? E como é que vais conseguir tal proeza? - Ora… Isso agora é cá comigo. Eu é que sei. |
![]() Sinto que estou sempre a dizer o mesmo, que os meus textos são repetições cíclicas dos mesmos assuntos e que estes são, só por si, repetições cíclicas e enfadonhas deles próprios. |
![]() Foi paradigmático o facto de, aquando da confirmação (pela enésima vez) da intenção do Governo em avançar com o TGV Lisboa/Porto, as únicas críticas, reparos ou protestos de autarcas da região terem tido por base a habitual choraminga do “também queremos o comboio ao pé da porta”. |
![]() Há uns meses, em circunstâncias que não vêm ao caso, tive o prazer de privar com José Luís Peixoto e a sua mulher, Patrícia Pinto. Foram dias muito agradáveis em que fiquei a conhecer um pouco da pessoa que está por trás do escritor. |
![]() Podemos dizer que um jogo de futebol sem público ou vida sem música é como um jardim sem flores. Não que um jardim sem flores deixe de ser um jardim. Acontece que, como no jogo de futebol, fica melhor se as tiver. Já se for uma sopa de feijão com couves que não tenha couves, a comparação com o jardim sem flores não funciona, pela singela razão de que uma sopa de feijão com couves que não tenha couves, sendo ainda sopa, sopa de feijão com couves não é de certeza. |
![]() Entrados na terceira década do século XXI, o Mundo dos humanos permanece o lugar povoado das injustiças, da desigualdade e do domínio de uns sobre os outros. Não é a mudança dos calendários que nos muda a vida. |
» 2021-01-12
» João Carlos Lopes
O TGV, o Ribatejo e o futuro das regiões - joão carlos lopes |
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2021: uma vida que afaste a morte - inês vidal |
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» José Ricardo Costa
A Pilhagem - josé ricardo costa |
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