Os velhos e os fracos - jorge carreira maia
Opinião » 2021-01-23 » Jorge Carreira Maia"Quando nem a religião nem a moral são suficientes para que os indivíduos percebam o dano que condutas irresponsáveis provocam, só resta a violência"
É plausível afirmar que o corpo político, ao contrário do que aconteceu na primeira vaga da pandemia, não tem estado feliz na actual situação. Refiro-me ao Presidente da República, ao Primeiro-Ministro e aos dirigentes das várias oposições. Todos eles não viram, ou não quiseram ver, que os portugueses, passado o medo inicial, iriam complicar as coisas e tomar o vírus como coisa sem importância. Não sei, todavia, se os esforços conjuntos de Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa e Rui Rio, como principal líder da oposição, mesmo sem os sinais contraditórios dados, seriam suficientes para impor aos portugueses, de forma mais musculada, outro tipo de comportamentos.
Há um problema que perpassa na forma como parte da população passou a lidar com o assunto. O vírus não é tão mortal como dizem. Mata alguns velhos e, entre os mais novos, só é problemático para os que sofrem de algumas doenças, isto é, os mais fracos. É isto que, apesar de falso e imoral, está na cabeça de muita gente, que acha que o determinado pelo poder político é apenas facultativo e um embaraço que não se deve tomar em consideração. Trata-se de uma forma de selecção natural e, por isso, justa. Eu que estou no vigor da vida – pensam – não tenho de ser cerceado nos direitos por causa de velhos e fracos. Tenho direito de facto, mesmo que contrarie a lei, a fazer o Natal e a passagem de ano como bem me aprouver, assim como conduzir a vida como entender. Mesmo que estas ideias não tivessem sido formuladas explicitamente por muitos dos que infringiram recomendações e leis, elas estavam lá a soprar-lhes aos ouvidos.
Isto mostra como faliram nas sociedades contemporâneas conceitos como de próximo ou de dever para com os outros. A secularização da sociedade portuguesa, composta em grande parte por católicos não praticantes, conduziu a que se deixasse de ter disponível a ideia de amor ao próximo como guia dos comportamentos. Por outro lado, a ideia de dever para com o outro, uma forma laica de impor uma moral do respeito, não encontrou espaço para florescer, num ambiente marcado pela cultura do eu e dos seus interesses e prazeres. Ora quando nem a religião nem a moral são suficientes para que os indivíduos percebam o dano que condutas irresponsáveis provocam, só resta a violência legítima dos representantes do soberano, que em democracia é o povo. É para isso que serve, em primeiro lugar, o poder político, tornar a comunidade, segundo as regras do Estado de direito, um espaço seguro para todos, incluindo velhos e fracos. E isto tem falhado.
Os velhos e os fracos - jorge carreira maia
Opinião » 2021-01-23 » Jorge Carreira MaiaQuando nem a religião nem a moral são suficientes para que os indivíduos percebam o dano que condutas irresponsáveis provocam, só resta a violência
É plausível afirmar que o corpo político, ao contrário do que aconteceu na primeira vaga da pandemia, não tem estado feliz na actual situação. Refiro-me ao Presidente da República, ao Primeiro-Ministro e aos dirigentes das várias oposições. Todos eles não viram, ou não quiseram ver, que os portugueses, passado o medo inicial, iriam complicar as coisas e tomar o vírus como coisa sem importância. Não sei, todavia, se os esforços conjuntos de Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa e Rui Rio, como principal líder da oposição, mesmo sem os sinais contraditórios dados, seriam suficientes para impor aos portugueses, de forma mais musculada, outro tipo de comportamentos.
Há um problema que perpassa na forma como parte da população passou a lidar com o assunto. O vírus não é tão mortal como dizem. Mata alguns velhos e, entre os mais novos, só é problemático para os que sofrem de algumas doenças, isto é, os mais fracos. É isto que, apesar de falso e imoral, está na cabeça de muita gente, que acha que o determinado pelo poder político é apenas facultativo e um embaraço que não se deve tomar em consideração. Trata-se de uma forma de selecção natural e, por isso, justa. Eu que estou no vigor da vida – pensam – não tenho de ser cerceado nos direitos por causa de velhos e fracos. Tenho direito de facto, mesmo que contrarie a lei, a fazer o Natal e a passagem de ano como bem me aprouver, assim como conduzir a vida como entender. Mesmo que estas ideias não tivessem sido formuladas explicitamente por muitos dos que infringiram recomendações e leis, elas estavam lá a soprar-lhes aos ouvidos.
Isto mostra como faliram nas sociedades contemporâneas conceitos como de próximo ou de dever para com os outros. A secularização da sociedade portuguesa, composta em grande parte por católicos não praticantes, conduziu a que se deixasse de ter disponível a ideia de amor ao próximo como guia dos comportamentos. Por outro lado, a ideia de dever para com o outro, uma forma laica de impor uma moral do respeito, não encontrou espaço para florescer, num ambiente marcado pela cultura do eu e dos seus interesses e prazeres. Ora quando nem a religião nem a moral são suficientes para que os indivíduos percebam o dano que condutas irresponsáveis provocam, só resta a violência legítima dos representantes do soberano, que em democracia é o povo. É para isso que serve, em primeiro lugar, o poder político, tornar a comunidade, segundo as regras do Estado de direito, um espaço seguro para todos, incluindo velhos e fracos. E isto tem falhado.
Eleições "livres"... » 2024-03-18 » Hélder Dias |
Este é o meu único mundo! - antónio mário santos » 2024-03-08 » António Mário Santos Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza. |
Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato » 2024-03-08 » Maria Augusta Torcato Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente. |
A crise das democracias liberais - jorge carreira maia » 2024-03-08 » Jorge Carreira Maia A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David. |
A carne e os ossos - pedro borges ferreira » 2024-03-08 » Pedro Ferreira Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA. |
O Flautista de Hamelin... » 2024-02-28 » Hélder Dias |
Este mundo e o outro - joão carlos lopes » 2024-02-22 Escreve Jorge Carreira Maia, nesta edição, ter a certeza de que este mundo já não é o seu e que o mundo a que chamou seu acabou. “Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás”, vai ele dizendo na suas palavras sempre lúcidas e brilhantes, concluindo que “vivemos já num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria”. |
2032: a redenção do Planeta - jorge cordeiro simões » 2024-02-22 » Jorge Cordeiro Simões
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Avivar a memória - antónio gomes » 2024-02-22 » António Gomes Há dias atrás, no âmbito da pré-campanha eleitoral, visitei o lugar onde passei a maior parte da minha vida (47 anos), as oficinas da CP no Entroncamento. Não que tivesse saudades, mas o espaço, o cheiro e acima de tudo a oportunidade de rever alguns companheiros que ainda por lá se encontram, que ainda lá continuam a vender a sua força de trabalho, foi uma boa recompensa. |
Eleições, para que vos quero! - antónio mário santos » 2024-02-22 Quando me aborreço, mudo de canal. Vou seguindo os debates eleitorais televisivos, mas, saturado, opto por um filme no SYFY, onde a Humanidade tenta salvar com seus heróis americanizados da Marvel o planeta Terra, em vez de gramar as notas e as opiniões dos comentadores profissionais e partidocratas que se esfalfam na crítica ou no elogio do seu candidato de estimação. |
» 2024-02-28
» Hélder Dias
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