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Fricções - antónio mário santos

Opinião  »  2023-10-21  »  António Mário Santos

Tenho, hoje, muita dificuldade em aceitar verdades feitas. Não consigo deixar de pensar que, por detrás duma posição irredutível, não deixam de existir interesses, por vezes diversos e múltiplos, que, quais margens de rio, estreitam o leito da corrente, colocando o interlocutor ante a necessidade duma opção, tipo branco ou preto.

Nem sempre procedi assim. Pelo contrário. Ser a favor ou contra, aprendi-o desde a infância, quando um avô republicano, carbonário, ateu até à medula, me passeava no antiga tabuleiro da praça 5 de Outubro, quando se aproximou o padre Aparício; tendo feito intenção que lhe beijasse a mão, o puxão de recuo e o imprecação rude – as mãos que se beijam são as do avô ou do pai, nunca do padre – ficou impresso na mente como, mais tarde, na escola, a tabuada. Ou, já na primeira classe da primária, nos degraus da igreja do Salvador, ao solicitar ao padre Búzio um cartão da catequese, com o objectivo de poder assistir aos filmes de cóbois que se davam na antiga sala do Salvador, me tenha surpreendido tanto a resposta, “tu também queres?”, que só em casa, na dúvida que levava no coração, soube que «a nossa família não era religiosa, o padre sabia-o» , eu ainda não percebia o que isso era.

A alternativa foi meu pai levar-me consigo, aos fins de semana e feriados, para as sessões do Virgínia, cujo ecrã se enchia de filibusteiros e cobóis que me faziam sonhar com essas pátrias longínquas onde o bem vencia sempre o mal e os brancos eram heróis que matavam os índios que eram os maus da fita, porque eram peles-vermelhas, raptavam as raparigas loiras dos futuros povoadores e escalpavam as cabeças dos seus companheiros.

Onde comecei a duvidar da matriz dogmática de parte da minha adolescência e juventude, foi já depois do 25 de Abril, na vida política. O inimigo passou a adversário, a democracia criou a alternativa e o diverso, a dúvida e o respeito pelo outro humanizaram o pé atrás do sim ou não sempre em quezília. A aprendizagem de que não há uma resposta única para cada questão, é algo que se aprende (será que se aprende) com os percalços, amarguras e as mudanças das sociedades no tempo; com a reflexão do íntimo de si como porta giratória para o colectivo.

Todo este sururu da memória me assalta ante as imagens televisivas da nova guerra na Palestina, entre o Hamas e Israel. A condenação, justa, dos massacres indesculpáveis cometidos pelo Hamas contra o povo judeu, por todo o mundo civilizado, criou situações de branco e preto, que a imprensa e as redes sociais utilizaram, não só como informação, mas como forma de pressão e condicionamento do direito de cada a uma opinião própria. Os casos da rede social X (antigo Twitter) com a sua difusão de notícias falsificadas, ainda que desmentidas, difundidas como verdades por todo o planeta, demonstram como o mundo a branco e preto assenta em objectivos escondidos, que defendem interesses económicos e lucros, independentemente do sofrimento, dor, miséria, destruição e morte que ocasionem.

Algo aprendi no tempo: as “religiões do livro” (judaísmo, cristianismo e islamismo) assentaram a sua história num princípio dogmático nada pacífico: ou crês (na minha verdade) ou morres.

Aos massacres condenáveis e condenados do Hamas, sucederam-se os massacres condenáveis, de Israel, mas silenciados pelos que condenaram os primeiros, tentando fazer esquecer que a resposta de vingança do governo israelita foi exercida sobre um povo, o palestiniano, aprisionado na faixa de Gaza pelos dois massacradores fundamentalistas religiosos: o islamismo muçulmano e o extremismo religioso judaico. Ambos dogmáticos, odiando-se mutuamente, procurando cada um destruir o outro; ambos alheios ao sofrimento que provocam nas populações que controlam. Com uma única diferença: Israel é uma pátria, uma «democracia do povo judaico», o que tem verdadeira integração e cidadania; Gaza, uma prisão a céu aberto, controlada do exterior pelo exército israelita, no interior pelo exército radical do Hamas. Prisioneiro, em ambas, o palestiniano, o povo errante, diáspora de sofrimento e negação, de quem se lamenta a humilhação, mas não se resolve a dignidade de existir numa terra onde sempre viveu, apátrida na sua própria pátria.

Nem Israel, nem o Ocidente civilizado, nem o mundo árabe, avançam com uma solução satisfatória. Uma Palestina, dois países. Ou apenas um só, onde as religiões não dividam, não gerem ódio e extremismo, onde ser judeu, cristão, muçulmano, israelita, árabe ou palestiniano, seja aceite pelo que é, entre todos, real: a pertença à espécie humana.

 

 

 

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