Este não é o meu mundo - jorge carreira maia
" Esta sensação de não se pertencer ao mundo em que se vive não é inédita"
Hoje, domingo, dia em que escrevo, tive não apenas a sensação, mas a certeza de que este mundo já não é o meu. Esse a que chamei meu acabou. Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás. Penso agora nisso e não consigo perceber como e quando o meu mundo morreu, e um outro, ao qual não pertenço, nasceu, principiou a balbuciar e a gatinhar, depois a erguer-se sobre as pernas, a andar e a fazer-se ouvir, com uma voz cada vez mais alta. Havia sinais, mas pareciam coisas sem sentido, a princípio nem lhes dava importância. Por exemplo, a falência das antigas regras de tratamento. Não se tratava um homem desconhecido por senhor Jorge, mas por senhor Maia. Era o último nome que indicava uma pertença e constituía a identidade. Quando a moda do primeiro nome começou, talvez já o meu mundo estivesse moribundo.
Esta sensação de não se pertencer ao mundo em que se vive não é inédita. Contudo, cada um tem a sua experiência e é essa que conta para ele. O meu mundo começou antes de eu nascer. Começou em 1945, com o fim da segunda grande guerra. Nasci nele e fui por ele moldado, mesmo se vivi muitos anos num país que estava fora do mundo que existia. Esse mundo que me acolheu fugia de um outro tenebroso. Trazia uma promessa de liberdade, que demorou, como tudo, a chegar a Portugal. Havia nele um conjunto de valores e de perspectivas do que era uma vida digna de ser vivida, tanto ao nível moral como político. Havia também a ilusão, vejo-o agora, de que esse mundo tinha um grande futuro diante de si. Nós que vivíamos nesse mundo fugíamos das trevas e não sabíamos que nos estávamos a dirigir de novo para elas.
Aqueles que viveram, em 1974, quase trinta anos depois, a chegada do mundo que começara em 1945, lembram-se que as grandes figuras políticas de então, apesar de defensoras de um regime de liberdade, eram figuras graves. Tinha-se a percepção de que elas estavam seriamente preocupadas com o rumo da comunidade. Não sei bem quando isso se perdeu, mas talvez tenha sido no início deste milénio. Esse mundo da gravitas política está morto. Talvez tenha morrido quando deixei de ser o senhor Maia e passei a ser o senhor Jorge. Um mundo em que apenas os clowns fascinam o eleitorado, onde gente sem programa, a não ser aproveitar a liberdade para a matar, nem ideias sobre o país é idolatrada pelas novas gerações já não é o meu mundo. Vivemos já, estou convicto, num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria.
Este não é o meu mundo - jorge carreira maia
Esta sensação de não se pertencer ao mundo em que se vive não é inédita
Hoje, domingo, dia em que escrevo, tive não apenas a sensação, mas a certeza de que este mundo já não é o meu. Esse a que chamei meu acabou. Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás. Penso agora nisso e não consigo perceber como e quando o meu mundo morreu, e um outro, ao qual não pertenço, nasceu, principiou a balbuciar e a gatinhar, depois a erguer-se sobre as pernas, a andar e a fazer-se ouvir, com uma voz cada vez mais alta. Havia sinais, mas pareciam coisas sem sentido, a princípio nem lhes dava importância. Por exemplo, a falência das antigas regras de tratamento. Não se tratava um homem desconhecido por senhor Jorge, mas por senhor Maia. Era o último nome que indicava uma pertença e constituía a identidade. Quando a moda do primeiro nome começou, talvez já o meu mundo estivesse moribundo.
Esta sensação de não se pertencer ao mundo em que se vive não é inédita. Contudo, cada um tem a sua experiência e é essa que conta para ele. O meu mundo começou antes de eu nascer. Começou em 1945, com o fim da segunda grande guerra. Nasci nele e fui por ele moldado, mesmo se vivi muitos anos num país que estava fora do mundo que existia. Esse mundo que me acolheu fugia de um outro tenebroso. Trazia uma promessa de liberdade, que demorou, como tudo, a chegar a Portugal. Havia nele um conjunto de valores e de perspectivas do que era uma vida digna de ser vivida, tanto ao nível moral como político. Havia também a ilusão, vejo-o agora, de que esse mundo tinha um grande futuro diante de si. Nós que vivíamos nesse mundo fugíamos das trevas e não sabíamos que nos estávamos a dirigir de novo para elas.
Aqueles que viveram, em 1974, quase trinta anos depois, a chegada do mundo que começara em 1945, lembram-se que as grandes figuras políticas de então, apesar de defensoras de um regime de liberdade, eram figuras graves. Tinha-se a percepção de que elas estavam seriamente preocupadas com o rumo da comunidade. Não sei bem quando isso se perdeu, mas talvez tenha sido no início deste milénio. Esse mundo da gravitas política está morto. Talvez tenha morrido quando deixei de ser o senhor Maia e passei a ser o senhor Jorge. Um mundo em que apenas os clowns fascinam o eleitorado, onde gente sem programa, a não ser aproveitar a liberdade para a matar, nem ideias sobre o país é idolatrada pelas novas gerações já não é o meu mundo. Vivemos já, estou convicto, num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria.
![]() Nos últimos dias do ano veio a revelação da descoberta de mais um trilho de pegadas de dinossauros na Serra de Aire. Neste canto do mundo, outras vidas que aqui andaram, foram deixando involuntariamente o seu rasto e na viagem dos tempos chegaram-se a nós e o passado encontra-se com o presente. |
![]() É um banco, talvez, feliz! Era uma vez um banco. Não. É um banco e um banco, talvez, feliz! E não. Não é um banco dos que nos desassossegam pelo que nos custam e cobram, mas dos que nos permitem sossegar, descansar. |
![]() O milagre – a eventual vitória de Kamala Harris nas eleições norte-americanas – esteve longe, muito longe, de acontecer. Os americanos escolheram em consciência e disseram claramente o que queriam. Não votaram enganados ou iludidos; escolheram o pior porque queriam o pior. |
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![]() Dir-se-ia que três décadas passaram num ápice. No entanto, foram cerca de 11 mil dias iguais a outros 11 mil dias dos que passaram e dos que hão-de vir. Temos, felizmente, uma concepção e uma percepção emocional da história, como se o corpo vivo da sociedade tivesse os mesmos humores da biologia humana. |
![]() Quando se pergunta a alguém, que nunca teve os holofotes apontados para si, se quer ser entrevistado para um jornal local ou regional, ele diz logo “Entrevistado? Mas não tenho nada para dizer!”. Essa é a resposta que surge mais vezes de gente que nunca teve possibilidade de dar a sua opinião ou de contar um episódio da sua vida, só porque acha que isso não é importante, Toda a gente está inundada pelos canhenhos oficiais do que é importante para a nossa vida e depois dessa verdadeira lavagem ao cérebro é mais que óbvio que o que dizem que é importante está lá por cima a cagar sentenças por tudo e por nada. |
![]() Para lembrar o 30.º aniversário do renascimento do “Jornal Torrejano”, terei de começar, obrigatoriamente, lembrando aqui e homenageando com a devida humildade, o Joaquim da Silva Lopes, infelizmente já falecido. |
![]() Uma existência de trinta anos é um certificado de responsabilidade. Um jornal adulto. Com tarimba, memória, provas dadas. Nasceu como uma urgência local duma informação séria, transparente, num concelho em que a informação era controlada pelo conservadorismo católico e o centrismo municipal subsidiado da Rádio Local. |
![]() Os gloriosos trinta, a expressão original onde me fui inspirar, tem pouco que ver com longevidade e muito com mudança, desenvolvimento, crescimento, progresso. Refere-se às três décadas pós segunda guerra mundial, em que a Europa galopou para se reconstruir, em mais dimensões que meramente a literal. |
![]() Nos cerca de 900 anos de história, se dermos como assente que se esta se terá iniciado com as aventuras de D. Afonso Henriques nesta aba da Serra de Aire, os 30 anos de vida do “Jornal Torrejano”, são um tempo muito breve. |