JOGO AMIGÁVEL
"Na sociedade pode haver vencedores, não tem é de haver derrotados."
Vale a pena ver estes cinco golos. Pelos golos em si, obras de arte de elevada fineza, mas também para pensar nas putativas reacções dos guarda-redes que os sofreram. Golos destes são um hino ao futebol e fazem a alegria de quem gosta do desporto-rei. Mas pensar na reacção dos guarda-redes que os sofreram pode revelar-se um pedagógico exercício.
Um economista ou um político pode ou não apreciar futebol. Um guarda-redes, por inerência, é alguém que o aprecia e o vive com intenso prazer. Se os guarda-redes que sofreram estes belos golos os vissem a partir de uma posição neutra e imparcial, iriam apreciá-los com um prazer tão intenso como qualquer outro adepto de bom futebol. Mas isso é impossível. Guarda-redes que os sofrem e avançados que os marcam, sendo ambos apreciadores de futebol, estão comprometidos numa situação de inexorável incompatibilidade na qual a alegria de uns só pode existir à custa da tristeza dos outros. O avançado fica feliz por marcar, mas, por muito belo que seja o golo, leva o guarda-redes a um estado de tristeza, frustração, irritação, desespero. Se, pelo contrário, os guarda-redes defendessem aquelas bolas, ficariam felizes e orgulhosos mas milhares de pessoas, incluindo os jogadores adversários, teriam perdido a alegria por estes belos golos.
Como superar este estado agónico? Má notícia: não se supera. No desporto não há qualquer hipótese de o superar, daí a sua dimensão trágica. Um jogo de futebol não é uma realidade moral. Tem regras, claro, mas regras que, como no código da estrada, servem apenas para lhe conferir alguma racionalidade, impedir o caos e a pura arbitrariedade. Mas não é uma realidade moral na qual os interesses de uns não devem poder ser satisfeitos à custa do prejuízo de outros. Bem, pelo contrário, como numa guerra, trata-se de uma espécie de contrato tácito entre dois inimigos que aceitam o facto de, no final, haver vencedores e vencidos.
E na sociedade, será também assim? Depende. Se encararmos as relações sociais e económicas como uma espécie de jogo no qual a vitória de uns implica a derrota de outros, então, neste caso, os conflitos sociais e económicos estarão no mesmo registo de um conflito entre um guarda-redes que defende e um avançado que marca. Ora, isso pode acontecer se retirarmos a moral da política e da economia e, como no futebol, limitarmos as relações sociais e económicas a um básico conjunto de regras que visam apenas impedir que a sociedade caia numa caótica situação de guerra, não de todos contra todos como dizia Hobbes, mas de alguns contra muitos.
Isso, porém, não deve acontecer. Tal como no Evangelho de S. Marcos se diz que o sábado foi feito por causa do homem e não o homem por causa do sábado, também a economia e a política existem por causa do homem, não é o homem que existe para política e a economia e onde a vitória de uns é feita à custa da derrota de muitos. A política e a economia não devem ser vistas como um jogo sem regras, mas como actividades cujas regras impedem a ideia de a sociedade se poder transformar num casino onde poucos são felizes e muitos são infelizes.
Os golos são belos como é belo o acesso a bens sociais como a saúde, a educação, a protecção dos mais desfavorecidos devido aos azares da vida ou até uma vida materialmente decente. Acontece que no futebol não existe o conceito mas uma sociedade sem ela é necessariamente doente: chama-se justiça social. No futebol são onze contra onze e no final ganha a Alemanha. Socialmente, os interesses de uns não são necessariamente os interesses de outros. Não há volta a dar. E muito bem, pode haver vencedores. Não tem é de haver derrotados.
JOGO AMIGÁVEL
Na sociedade pode haver vencedores, não tem é de haver derrotados.
Vale a pena ver estes cinco golos. Pelos golos em si, obras de arte de elevada fineza, mas também para pensar nas putativas reacções dos guarda-redes que os sofreram. Golos destes são um hino ao futebol e fazem a alegria de quem gosta do desporto-rei. Mas pensar na reacção dos guarda-redes que os sofreram pode revelar-se um pedagógico exercício.
Um economista ou um político pode ou não apreciar futebol. Um guarda-redes, por inerência, é alguém que o aprecia e o vive com intenso prazer. Se os guarda-redes que sofreram estes belos golos os vissem a partir de uma posição neutra e imparcial, iriam apreciá-los com um prazer tão intenso como qualquer outro adepto de bom futebol. Mas isso é impossível. Guarda-redes que os sofrem e avançados que os marcam, sendo ambos apreciadores de futebol, estão comprometidos numa situação de inexorável incompatibilidade na qual a alegria de uns só pode existir à custa da tristeza dos outros. O avançado fica feliz por marcar, mas, por muito belo que seja o golo, leva o guarda-redes a um estado de tristeza, frustração, irritação, desespero. Se, pelo contrário, os guarda-redes defendessem aquelas bolas, ficariam felizes e orgulhosos mas milhares de pessoas, incluindo os jogadores adversários, teriam perdido a alegria por estes belos golos.
Como superar este estado agónico? Má notícia: não se supera. No desporto não há qualquer hipótese de o superar, daí a sua dimensão trágica. Um jogo de futebol não é uma realidade moral. Tem regras, claro, mas regras que, como no código da estrada, servem apenas para lhe conferir alguma racionalidade, impedir o caos e a pura arbitrariedade. Mas não é uma realidade moral na qual os interesses de uns não devem poder ser satisfeitos à custa do prejuízo de outros. Bem, pelo contrário, como numa guerra, trata-se de uma espécie de contrato tácito entre dois inimigos que aceitam o facto de, no final, haver vencedores e vencidos.
E na sociedade, será também assim? Depende. Se encararmos as relações sociais e económicas como uma espécie de jogo no qual a vitória de uns implica a derrota de outros, então, neste caso, os conflitos sociais e económicos estarão no mesmo registo de um conflito entre um guarda-redes que defende e um avançado que marca. Ora, isso pode acontecer se retirarmos a moral da política e da economia e, como no futebol, limitarmos as relações sociais e económicas a um básico conjunto de regras que visam apenas impedir que a sociedade caia numa caótica situação de guerra, não de todos contra todos como dizia Hobbes, mas de alguns contra muitos.
Isso, porém, não deve acontecer. Tal como no Evangelho de S. Marcos se diz que o sábado foi feito por causa do homem e não o homem por causa do sábado, também a economia e a política existem por causa do homem, não é o homem que existe para política e a economia e onde a vitória de uns é feita à custa da derrota de muitos. A política e a economia não devem ser vistas como um jogo sem regras, mas como actividades cujas regras impedem a ideia de a sociedade se poder transformar num casino onde poucos são felizes e muitos são infelizes.
Os golos são belos como é belo o acesso a bens sociais como a saúde, a educação, a protecção dos mais desfavorecidos devido aos azares da vida ou até uma vida materialmente decente. Acontece que no futebol não existe o conceito mas uma sociedade sem ela é necessariamente doente: chama-se justiça social. No futebol são onze contra onze e no final ganha a Alemanha. Socialmente, os interesses de uns não são necessariamente os interesses de outros. Não há volta a dar. E muito bem, pode haver vencedores. Não tem é de haver derrotados.
![]() Imagino que as últimas eleições terão sido oportunidade para belos e significativos encontros. Não é difícil pensar, sem ficar fora da verdade, que, em muitas empresas, patrões e empregados terão ambos votado no Chega. |
![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
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![]() Agora que nos estamos a aproximar, no calendário católico, da Páscoa, talvez valha a pena meditar nos versículos 36, 37 e 38, do Capítulo 18, do Evangelho de João. Depois de entregue a Pôncio Pilatos, Jesus respondeu à pergunta deste: Que fizeste? Dito de outro modo: de que és culpado? Ora, a resposta de Jesus é surpreendente: «O meu reino não é deste mundo. |