Esta coisa de andar aos papéis...
Numa semana em que, literalmente, andei aos papéis, rebuscando e remexendo as centenas de cartas manuscritas que fui acumulando nestes anos de paixão pelo alfarrabismo, reli, deliciado algumas delas, com a paciência de um rato de biblioteca.
Não escondo que aqui ou ali, veio à tona a eterna dialética entre o bibliófilo que nunca terei sido e o alfarrabista em que acabei por me tornar. Ambos querem e desejam o melhor.
Foi uma semana em que revi cartas da Rainha Dona Amélia ou de Afonso Costa, de Raúl Brandão ou de Eugénio de Andrade. E também de tantos outros que escreviam o que sentiam, longe de imaginar que, algumas décadas depois, aquilo que escreveram com destinatário assumido seria assim “bisbilhotado”, mas que de outra forma, provavelmente se teria perdido, nunca tendo chegado a mãos certas. É também esse o papel do alfarrabista.
E porque muitas vezes, tantas vezes, a história se repete, não resisto a transcrever um excerto de uma das cartas que agora reencontrei, com mais de cem anos (de Setembro de 1911), onde já nessa altura se registavam e enalteciam os parcos recursos de um hospital e a nobreza de carácter de um profissional de saúde:
“... Reclamando contra deficiências existentes nos serviços technicos e administrativos do hospital Estephania, comunicou ao Exº Enfermeiro-mor, o Director da Enfermaria d’aquelle hospital o seguinte facto: “ Poucos tempos antes viera para a Enfermaria Particular, tambem a meu cargo, uma doente com hernia estrangulada que requeria urgencia operatoria. Assim o comprehendeu, e bem, o cirurgião de serviço, que empregou todos os esforços para executar o acto operatorio. Não tinha ajudantes. Mandou recados, telephonou para collegas que só obsequiosamente o poderiam vir auxiliar. Não tinha quem cloroformisasse e por ultimo também não dispunha de roupas e compressas esterilisadas. Esse cirurgião, muito novo, pouco experiente portanto, mas muito illustrado, venceu todas estas difficuldades e ainda as do acto operatorio, que não foram poucas, fazendo ferver as roupas e as compressas, substituindo o clorophormio por uma rachiasnesthesia e por fim lá arranjou um amigo que lhe serviu d’ajudante.
O exito foi completo. Mas deve-se consentir num primeiro hospital o que só poderá ser tolerado em logar sertanejo?” É Vª Exª, conforme se averiguou, esse cirurgião; e, por isso, com muita satisfação venho transmitir-lhe o justo louvor que lhe foi conferido pelo zelo, dedicação e superior competência tão notavelmente demonstrados nas circunstancias que o Director da Enfermaria refere...”
O cirurgião em causa foi o Dr. Artur Ricardo Jorge, de quem adquiri uma pequena parte do seu interessantíssimo espólio.
Como eu gosto de andar aos papéis...
(Adelino Correia-Pires, Outubro 2013)
Esta coisa de andar aos papéis...
Numa semana em que, literalmente, andei aos papéis, rebuscando e remexendo as centenas de cartas manuscritas que fui acumulando nestes anos de paixão pelo alfarrabismo, reli, deliciado algumas delas, com a paciência de um rato de biblioteca.
Não escondo que aqui ou ali, veio à tona a eterna dialética entre o bibliófilo que nunca terei sido e o alfarrabista em que acabei por me tornar. Ambos querem e desejam o melhor.
Foi uma semana em que revi cartas da Rainha Dona Amélia ou de Afonso Costa, de Raúl Brandão ou de Eugénio de Andrade. E também de tantos outros que escreviam o que sentiam, longe de imaginar que, algumas décadas depois, aquilo que escreveram com destinatário assumido seria assim “bisbilhotado”, mas que de outra forma, provavelmente se teria perdido, nunca tendo chegado a mãos certas. É também esse o papel do alfarrabista.
E porque muitas vezes, tantas vezes, a história se repete, não resisto a transcrever um excerto de uma das cartas que agora reencontrei, com mais de cem anos (de Setembro de 1911), onde já nessa altura se registavam e enalteciam os parcos recursos de um hospital e a nobreza de carácter de um profissional de saúde:
“... Reclamando contra deficiências existentes nos serviços technicos e administrativos do hospital Estephania, comunicou ao Exº Enfermeiro-mor, o Director da Enfermaria d’aquelle hospital o seguinte facto: “ Poucos tempos antes viera para a Enfermaria Particular, tambem a meu cargo, uma doente com hernia estrangulada que requeria urgencia operatoria. Assim o comprehendeu, e bem, o cirurgião de serviço, que empregou todos os esforços para executar o acto operatorio. Não tinha ajudantes. Mandou recados, telephonou para collegas que só obsequiosamente o poderiam vir auxiliar. Não tinha quem cloroformisasse e por ultimo também não dispunha de roupas e compressas esterilisadas. Esse cirurgião, muito novo, pouco experiente portanto, mas muito illustrado, venceu todas estas difficuldades e ainda as do acto operatorio, que não foram poucas, fazendo ferver as roupas e as compressas, substituindo o clorophormio por uma rachiasnesthesia e por fim lá arranjou um amigo que lhe serviu d’ajudante.
O exito foi completo. Mas deve-se consentir num primeiro hospital o que só poderá ser tolerado em logar sertanejo?” É Vª Exª, conforme se averiguou, esse cirurgião; e, por isso, com muita satisfação venho transmitir-lhe o justo louvor que lhe foi conferido pelo zelo, dedicação e superior competência tão notavelmente demonstrados nas circunstancias que o Director da Enfermaria refere...”
O cirurgião em causa foi o Dr. Artur Ricardo Jorge, de quem adquiri uma pequena parte do seu interessantíssimo espólio.
Como eu gosto de andar aos papéis...
(Adelino Correia-Pires, Outubro 2013)
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Em 2012, o psicólogo social Jonathan Haidt publicou a obra A Mente Justa: Porque as Pessoas Boas não se Entendem sobre Política e Religião. Esta obra é fundamental porque nos ajuda a compreender um dos dramas que assolam os países ocidentais, cujas democracias se estruturam, ainda hoje, pela dicotomia esquerda–direita. |
![]() Imagino que as últimas eleições terão sido oportunidade para belos e significativos encontros. Não é difícil pensar, sem ficar fora da verdade, que, em muitas empresas, patrões e empregados terão ambos votado no Chega. |
![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
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Direita e Esquerda, uma questão de sabores morais |