Será que não damos mais que isto?
"Não há um plano, um desenho, um esboço, que reconfigure o que foi traçado há 40 ou há 20 anos"
Nos idos da década de oitenta do século passado, muito do que se debateu sobre Torres Novas teve lugar na velha galeria Maria Lamas. Por ali passaram arquitectos, urbanistas e ambientalistas, gente como Gonçalo Ribeiro Teles ou Carlos Pimenta marcaram presença em activas discussões sobre o futuro de Torres Novas. Ontem, como hoje, se falava na necessidade de integrar a memória no que se planeia e na urgência de planear com coerência e abandonar os tempos da navegação à vista e da gestão reactiva do território.
Nessa altura, eram tempos românticos, autarcas como Casimiro Gomes Pereira e depois Arnaldo Santos participavam frequentemente nessas tertúlias da Associação do Património, sem medo de serem contaminados por “esquerdismos” ou outras alergias. Notava-se que gostavam de aprender, de enriquecer as suas perspectivas das coisas, tinham a intuição de que todos ganhamos quando todos sabemos mais e aprendemos uns com os outros, mesmo quando em campos de opinião opostos
Foi um privilégio termos tido agora, nesta acção da ADP, o "encontro do solstício" do passado mês de Dezembro, gente como Paulo Durão ou o reconhecido antropólogo da Universidade do Minho Luís Cunha, mas sobretudo Luís Vassalo Rosa, um homem com fortes ligações familiares a Torres Novas e que conhece, como ninguém, a história do planeamento urbanístico de Torres Novas nos últimos 50 anos, até pelo papel interveniente que desempenhou em algumas opções que se foram colocando enquanto, como arquitecto e urbanista, colaborou directamente com o município.
Ainda recentemente, noutras circunstâncias, deu mostras do carinho que continua a devotar esta terra, a respeito da coordenação entre a família e a autarquia, da grande exposição de pintura do seu familiar José Vassalo.
Voltando ao debate da ADP, ele foi fértil como não podia deixar de ser, com Vassalo Rosa a balizar os limites cidade e as suas quatro portas (uma bela metáfora sobre o que queremos fazer desta terra, mais do que tudo) ou Jorge Salgado Simões a desenhar, com o rigor sistemático do geógrafo, as três cidades que cabem num torrão com quase nove séculos: a cidade sem rumo, a cidade dos vazios e a cidade que falta fazer.
Não há um plano, um desenho, um esboço, que reconfigure o que foi traçado há 40 ou há 20 anos: faz-se aleatoriamente a ampliação de uma quartel de bombeiros encafuado entre prédios e um teatro, que já se admite que só dá para 20 anos; fala-se em piscinas e parques urbanos aqui, depois aquaparques ali, como quem fala de instalar quiosques, tudo avulso, por impulso. Há depois o deserto repartido pela cidade, vazios em processos de vegetalização que vão durar décadas: a imensa cratera da fiação de algodão, na Bica, a própria fábrica antiga, espaços como o da antiga Nery ou dos Claras e o próprio “centro histórico”, que não passa de uma construção mental dos torrejanos. Que fazer?
É preciso pensar nisto tudo e ousar admitir a complexidade como abordagem: o espaço, a demografia, o património, o rio, as vivências e as sociabilidades, a economia local, os equipamentos e as estruturas, a real e não a imaginada capacidade e potencial das instituições locais como agentes do “desenvolvimento” e da coesão da cidade, estratégias de requalificação da cidade em construção (Silvã, Chãs, Arrábida) e não apenas da sua zona fóssil, o chamado centro histórico, como lidar com facto de, dentro de 15 ou 20 anos, muitas das nossas aldeias estarem praticamente desabitadas, se temos ou não massa crítica e ainda alguma capacidade de a fixar, enfim: um caminho. Um carreiro que nos conduza os passos.
Entre as exigências da construção de um pensamento para a cidade e o concelho e a governação assente no “selfie” em tudo quanto é festarola e patuscada, ou a mimetização, à escala paroquial, dessa grande feira da ladra tecnológica chamada web summit, tida como salvação da economia e de um futuro concreto para a vida das pessoas e de uma cidade, vai uma grande distância. É um facto. Mas até isso seria bom discutir: será que, assunto arrumado, não damos mais que isto?
Será que não damos mais que isto?
Não há um plano, um desenho, um esboço, que reconfigure o que foi traçado há 40 ou há 20 anos
Nos idos da década de oitenta do século passado, muito do que se debateu sobre Torres Novas teve lugar na velha galeria Maria Lamas. Por ali passaram arquitectos, urbanistas e ambientalistas, gente como Gonçalo Ribeiro Teles ou Carlos Pimenta marcaram presença em activas discussões sobre o futuro de Torres Novas. Ontem, como hoje, se falava na necessidade de integrar a memória no que se planeia e na urgência de planear com coerência e abandonar os tempos da navegação à vista e da gestão reactiva do território.
Nessa altura, eram tempos românticos, autarcas como Casimiro Gomes Pereira e depois Arnaldo Santos participavam frequentemente nessas tertúlias da Associação do Património, sem medo de serem contaminados por “esquerdismos” ou outras alergias. Notava-se que gostavam de aprender, de enriquecer as suas perspectivas das coisas, tinham a intuição de que todos ganhamos quando todos sabemos mais e aprendemos uns com os outros, mesmo quando em campos de opinião opostos
Foi um privilégio termos tido agora, nesta acção da ADP, o "encontro do solstício" do passado mês de Dezembro, gente como Paulo Durão ou o reconhecido antropólogo da Universidade do Minho Luís Cunha, mas sobretudo Luís Vassalo Rosa, um homem com fortes ligações familiares a Torres Novas e que conhece, como ninguém, a história do planeamento urbanístico de Torres Novas nos últimos 50 anos, até pelo papel interveniente que desempenhou em algumas opções que se foram colocando enquanto, como arquitecto e urbanista, colaborou directamente com o município.
Ainda recentemente, noutras circunstâncias, deu mostras do carinho que continua a devotar esta terra, a respeito da coordenação entre a família e a autarquia, da grande exposição de pintura do seu familiar José Vassalo.
Voltando ao debate da ADP, ele foi fértil como não podia deixar de ser, com Vassalo Rosa a balizar os limites cidade e as suas quatro portas (uma bela metáfora sobre o que queremos fazer desta terra, mais do que tudo) ou Jorge Salgado Simões a desenhar, com o rigor sistemático do geógrafo, as três cidades que cabem num torrão com quase nove séculos: a cidade sem rumo, a cidade dos vazios e a cidade que falta fazer.
Não há um plano, um desenho, um esboço, que reconfigure o que foi traçado há 40 ou há 20 anos: faz-se aleatoriamente a ampliação de uma quartel de bombeiros encafuado entre prédios e um teatro, que já se admite que só dá para 20 anos; fala-se em piscinas e parques urbanos aqui, depois aquaparques ali, como quem fala de instalar quiosques, tudo avulso, por impulso. Há depois o deserto repartido pela cidade, vazios em processos de vegetalização que vão durar décadas: a imensa cratera da fiação de algodão, na Bica, a própria fábrica antiga, espaços como o da antiga Nery ou dos Claras e o próprio “centro histórico”, que não passa de uma construção mental dos torrejanos. Que fazer?
É preciso pensar nisto tudo e ousar admitir a complexidade como abordagem: o espaço, a demografia, o património, o rio, as vivências e as sociabilidades, a economia local, os equipamentos e as estruturas, a real e não a imaginada capacidade e potencial das instituições locais como agentes do “desenvolvimento” e da coesão da cidade, estratégias de requalificação da cidade em construção (Silvã, Chãs, Arrábida) e não apenas da sua zona fóssil, o chamado centro histórico, como lidar com facto de, dentro de 15 ou 20 anos, muitas das nossas aldeias estarem praticamente desabitadas, se temos ou não massa crítica e ainda alguma capacidade de a fixar, enfim: um caminho. Um carreiro que nos conduza os passos.
Entre as exigências da construção de um pensamento para a cidade e o concelho e a governação assente no “selfie” em tudo quanto é festarola e patuscada, ou a mimetização, à escala paroquial, dessa grande feira da ladra tecnológica chamada web summit, tida como salvação da economia e de um futuro concreto para a vida das pessoas e de uma cidade, vai uma grande distância. É um facto. Mas até isso seria bom discutir: será que, assunto arrumado, não damos mais que isto?
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Em 2012, o psicólogo social Jonathan Haidt publicou a obra A Mente Justa: Porque as Pessoas Boas não se Entendem sobre Política e Religião. Esta obra é fundamental porque nos ajuda a compreender um dos dramas que assolam os países ocidentais, cujas democracias se estruturam, ainda hoje, pela dicotomia esquerda–direita. |
![]() Imagino que as últimas eleições terão sido oportunidade para belos e significativos encontros. Não é difícil pensar, sem ficar fora da verdade, que, em muitas empresas, patrões e empregados terão ambos votado no Chega. |
![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
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